São Paulo, domingo, 12 de novembro de 1995
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a peça-chave do museu

SÉRGIO DÁVILA

A empresária Milú Villela, uma das principais acionistas do Grupo Itaú, foi eleita presidente do MAM (Museu de Arte Moderna) de São Paulo no final de 1994. Tomou posse em janeiro, fechou para reforma em junho e, 115 dias, 134 visitas a empresários e R$ 2,25 mi depois, apresentou um novo museu à cidade. Desde 24 de outubro último, o MAM conta com climatização adequada, auditório, bar e restaurantes novos, uma ala de exposições de acervo e terminais informatizados. "Tive de passar o chapéu para fazer um museu interativo", diz a milionária. "Aceitei o cargo para mudar de vida."

De onde veio o dinheiro?
Fiz 134 visitas, a pessoas físicas e empresários de pequeno a grande porte. Do total, 98 deram dinheiro, ou seja, 74% de respostas positivas.
Foi difícil fazer os empresários abrirem a carteira para a cultura?
Não foi fácil. Mas, fora um lugar, todos me trataram muito bem.
Que lugar?
Não posso falar. Quem contribuiu com mais de R$ 50 mil ganhou uma placa na entrada do museu e vai poder usar duas vezes por ano o salão grande. Quem deu entre R$ 10 mil e R$ 40 ganhou um painel com o nome da empresa. Os que doaram R$ 5 mil ganharam o nome numa cadeira do auditório.
Embora não goste de falar no assunto, a sra. é uma das maiores acionistas do Itaú. O grupo deu dinheiro?
O que eu faço aqui é um trabalho voluntário, profissional. Essa conotação é uma coisa... Primeiro, eu tenho família, filhos, não gostaria de estar exposta desse jeito. Segundo, não vem muito ao caso.
Mas o Itaú deu dinheiro?
Sim, o grupo todo colaborou. O Itauplan deu o projeto, o banco pagou a administração do projeto, a Deca forneceu cinco banheiros, a Itautec-Philco entrou com o banco de dados, vídeos, televisões...
Por que os museus brasileiros vivem à míngua?
Faltam leis que incentivem as doações. Nos Estados Unidos, as pessoas doam, mas descontam tudo do Imposto de Renda. Aqui, não temos lei de incentivo fiscal. A Lei Rouanet é de uma complexidade... Relatórios sobre relatórios, se você erra por R$ 5 invalida tudo, não é fácil. Todo mundo quer usar a Lei Rouanet -afinal, de cada 100 reais doados, você paga só R$ 30 ao imposto. Se fosse menos burocrática, facilitaria muito.
Mas não há também a cultura de não investir na cultura?
Lógico, as pessoas falam: "Tem tanta pobreza, eu já ajudo na Praça da Sé..." Ou não dão simplesmente.
Ainda vale a pena investir em acervo?
Acho bobagem. Acervo é uma coisa caríssima. Se eu quero fazer uma exposição específica, posso ligar para o Masp e pedir emprestado, por que não? Temos que investir muito mais em interação, informatização.
É esse o museu interativo?
Antigamente, a pessoa ia ao museu e via aquela obra distante, inacessível. Hoje, você pode interagir com ela, tocá-la, cheirá-la. Nós estamos dentro de um parque, eu quero que os frequentadores saibam que existe um museu aqui. Por isso mandei abrir umas janelas, coloquei mais vidros. O lema é "Entre que a casa é sua". Antes, eu não vinha ao MAM porque achava superelitista. Agora, quero que entre gente de agasalho, calção, suada da corrida, de qualquer jeito. Que as pessoas venham, entrem, saiam, façam piqueniques.
A sra. não tem formação artística. Foi difícil assumir a direção de um museu?
Depois de ser eleita, no final de 1994, visitei quase todos os museus de Londres, muitos da Europa, outros dos EUA. Estudei muito. E tentei me cercar de gente talentosa.
Com a reforma, como ficou a história da parede azul, que constava do projeto original de Lina Bo Bardi?
Agora, nas exposições experimentais, o curador escolhe a cor da parede. Nas exposições históricas, volta a cor original planejada por Lina Bo Bardi, que é um degradê de azul.
Um museu com duas paredes principais, uma azul e a outra de vidro, não é o horror de qualquer curador?
É importante dizer que não bate sol e que existem os painéis internos. Hoje, há duas tendências mundiais nos museus: uma diz que tem de ser todo escuro, só com aquela luz que focaliza a obra; outra, que deve ter luminosidade. Prefiro esta.
Qual o melhor museu do mundo?
A função social mais adequada quem cumpre é o Centro Cultural do Banco do Brasil, no Rio de Janeiro. Eles conseguem atingir uma população inacreditável, 300 mil pessoas por mês. Essa é a razão de um museu: popularizar a arte.
E o pior?
Não sei dizer. Mas acho que os museus privatizados, como é o caso do Mam, se saem melhor. Porque a burocracia do Estado é paralisante. Se bem que a Pinacoteca levou agora R$ 300 mil do ministro Weffort...
Por que uma empresária bem-sucedida aceita um pepino desses?
Desafio. Queria fazer uma coisa diferente da vida que eu levava.
Seu mandato termina em dezembro de 1996. Quais seus planos, então?
Nenhum. Mas sei que meu nome é cogitado para várias coisas por aí.
Que coisas?
Outro dia, um ministro falou que meu nome foi cogitado para uma área cultural. Mas, por enquanto, minha paixão está no Mam.

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