São Paulo, segunda-feira, 20 de novembro de 1995
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Desemprego leva famílias do Rio para assentamento no interior

CLÁUDIA MATTOS
ENVIADA ESPECIAL A RIO DAS OSTRAS (RJ)

Ao contrário de muitos assentamentos de sem-terra, o acampamento da Fazenda Cantagalo, no município de Rio das Ostras (170 km do Rio), reúne pessoas de raízes urbanas que procuram o campo como saída para o desemprego na cidade.
As 63 famílias que estão acampadas no local desde o dia 27 de março de 1994 vieram de Campo Grande, Santa Cruz (zona oeste do Rio) e de Nova Iguaçu (município da Baixada Fluminense).
Eles chegaram à Fazenda Cantagalo na esperança de conseguir demarcar, para cada família, 10 dos 1.749 hectares desapropriados pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
Porém uma disputa judicial entre o Incra e os ocupantes da terra está impedindo, até agora, que a integração de posse seja feita.
Enquanto aguardam a decisão, as 63 famílias (cerca de 250 pessoas) estão acampadas no alto de uma colina, ocupando, aos poucos e com constantes conflitos com os grileiros, suas encostas.
Ao olhar para o seu futuro pedaço de terra, Damião Fonseca do Amaral, 47, diz o que levou um operário da construção civil a trocar a cidade pelo campo. "Que tipo de vida eu ia poder dar para os meus cinco filhos na cidade? Meus meninos iam virar traficantes, e minhas meninas, prostitutas."
Maria Paula Gomes, 63, nasceu em Resplendor (MG) e viveu em fazenda até se mudar há mais de 30 anos para o Rio, onde trabalhou como enfermeira.
Com seu "time de futebol" -forma que usa para se referir a seus 11 filhos- criado, Maria Paula decidiu entrar para o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e pleitear um pedaço de terra.
Ela não esconde que é dona de um lote na favela Cavalo de Aço, em Realengo (zona norte). "Gosto de dizer a verdade. Eu tenho meu lote lá, mas é pequenininho. Quero uma terra onde eu possa plantar. Gosto mesmo é de trabalhar na roça. Plantar, ver crescer e colher."
Ainda sem terras demarcadas e com produção agrícola de subsistência, a vida das 63 famílias está longe de ser a sonhada pelos retirantes. Eles vivem em barracos de cerca de 3 m2, a água é de poço e eles não têm geladeiras.
Os mantimentos são doados por sindicatos filiados à CUT (Central Única dos Trabalhadores). As crianças frequentam uma escola municipal próxima.
Em um ano e oito meses de ocupação, os sem-terra já tiveram, pelo menos, dois conflitos com grileiros e policiais.
Na última semana, um sem-terra foi ferido com um tiro na mão, quando três policiais tentaram retirar uma demarcação de terra que estava sendo feita. Os grileiros alegam que o policial atirou depois que os sem-terra atiraram. Os sem-terra dizem que não dispararam nenhum tiro.

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