São Paulo, quarta-feira, 22 de novembro de 1995
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Acertado acordo de paz para a Bósnia

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Erramos: 24/11/95
Diferentemente do que informou texto publicado à pág. 2-12 ( Mundo) de 22/11, os bósnios não são árabes. No século 7º a região foi colonizada por eslavos e no século 14, por turcos.
Os presidentes de Sérvia, Bósnia e Croácia rubricaram ontem acordo para estabelecer a paz na ex-Iugoslávia, após 1.606 dias de conflitos que deixaram cerca de 200 mil mortos e 2 milhões de refugiados.
erimônia solene de assinatura acontecerá em Paris em data não-fixada. O acordo deixa uma questão territorial indefinida e será implementado por força internacional de paz de 60 mil soldados, liderada pelos EUA.
O sérvio Slobodan Milosevic, 54, o bósnio Alija Izetbegovic, 70, e o croata Franjo Tudjman, 73, trocaram apertos de mãos, sem sorrisos, após terem rubricado o documento.
O acordo ocorreu depois de conferência de três semanas e intensas deliberações nas últimas 72 horas. Os três líderes da ex-Iugoslávia receberam enorme pressão do governo dos EUA para solucionar o impasse.
Sucessivos prazos anunciados como fatais pelos EUA para a conferência produzir resultados foram adiados durante a segunda-feira. O último, às 23h30 locais de anteontem (2h30 de ontem em Brasília).
Naquela altura, Sérvia e Croácia estavam em acordo com todos os pontos do pacto, mas a Bósnia se recusava a aceitar alguns deles. Izetbegovic só abriu mão de suas exigências na manhã de ontem.
O anúncio do tratado foi feito pelo presidente Bill Clinton, que, na véspera, havia intervindo pessoalmente com um telefonema para Tudjman, que ameaçava abandonar a conferência, insatisfeito com suas conclusões.
Clinton, 49, ligou para os três presidentes à tarde para agradecer-lhes e dizer que haviam feito "uma coisa honrada e nobre".
O acordo prevê a manutenção do Estado da Bósnia-Herzegóvina nas suas fronteiras atuais, dividido em uma federação muçulmano-croata e uma república bósnia-sérvia, com territórios quase iguais em tamanho.
Haverá governo, Parlamento e Justiça centrais com representação dos três grupos (sérvios, croatas e muçulmanos). A capital, Sarajevo, será uma cidade unificada e a sede do governo central.
Os refugiados terão assegurado o direito de retornar ao país.
Pessoas acusadas de crimes de guerra, como os líderes civil e militar dos sérvios na Bósnia, respectivamente, Radovan Karadzic e Ratko Mladic, vão ser excluídos da vida política do país.
Uma comissão independente será criada para observar se desrespeitos aos direitos humanos são cometidos. As eleições para o governo e Parlamento centrais terão supervisão internacional.
Alguns líderes do "parlamento" sérvio na Bósnia já afirmavam ontem que o acordo de Dayton os surpreendeu e que ele não tem sua aprovação.
A questão que fica em aberto, para ser resolvida por mediadores, é a largura que terá o "corredor de Posavina, faixa de terra que ligará as partes noroeste e leste do território dos sérvios na Bósnia.
Os EUA, a União Européia e a Rússia foram testemunhas do acordo e assumiram a responsabilidade pela implementação.
O acordo rubricado ontem é o terceiro para pôr fim ao conflito na ex-Iugoslávia. Os dois anteriores não foram implementados.
O primeiro, conhecido como "Plano Cutileiro", por ter sido articulado pelo diplomata português José Cutileiro em nome da então Comunidade Européia, é de 1992 e foi assinado por representantes de Sérvia, Bósnia e Croácia.
O segundo, chamado "Plano Vance-Owen", em homenagem a seus promotores, o ex-secretário de Estado dos EUA Cyrus Vance e o ex-chanceler britânico Lord Owen, é de 1993 e também foi assinado pelos três grupos.
As chances de implementação do acordo de Dayton são maiores por causa do compromisso do governo dos EUA de enviar pelo menos 20 mil soldados norte-americanos com esse objetivo.
A guerra na ex-Iugoslávia é a mais longa e a mais sangrenta em território europeu desde o fim da Segunda Guerra Mundial.
Ela começou em 1991, após o desmembramento da Iugoslávia, que havia sido criada em 1945, com a união de Sérvia, Montenegro, Croácia, Macedônia, Eslovênia, Bósnia-Herzegóvina.
Após o desmembramento, o presidente Milosevic começou a defender a tese da "Grande Sérvia", que anexaria partes do território da Bósnia-Herzegóvina e da Croácia habitadas por grande número de sérvios.
Diferenças religiosas (o governo bósnio é de muçulmanos, os croatas são católicos romanos, e os sérvios são cristãos ortodoxos) e étnicas (os sérvios e os croatas são eslavos, os bósnios, árabes) intensificaram as rivalidades e embruteceram a guerra.

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