São Paulo, quarta-feira, 22 de novembro de 1995
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ACSP: onde a vida está

ANTONIO DELFIM NETTO

No dia 13 participamos de uma interessante reunião na Associação Comercial de São Paulo. Ficaram evidentes os efeitos perversos sobre as pequenas e médias empresas nacionais da enorme constrição de crédito imposta para sustentar uma taxa de câmbio sobrevalorizada.
A experiência de argutos empresários, revelada nas discussões, confirmou as importantes distorções produzidas pela restrição física do crédito e a consequente elevação da taxa de juros. Alguns economistas aceitam a idéia de que o principal canal de ação da política monetária é sobre a taxa de juro e desta para uma redução dos investimentos (e, eventualmente, do consumo), o que cortaria a demanda. Os seus efeitos, entretanto, parecem ser maiores sobre a oferta, ou seja, sobre a desorganização do processo produtivo.
A distinção é muito importante do ponto de vista da política econômica de curto e longo prazo. Se o canal de transmissão dos efeitos de uma elevação da taxa de juros fosse uma redução dos investimentos, a demanda seria cortada no curto prazo, mas nenhuma distorção seria introduzida no longo prazo.
Os investimentos seriam reduzidos em todos os setores, mantendo a prioridade das taxas de retorno. O corte reduziria o volume de investimento, mas não se introduziria distorção alocativa que prejudicasse o crescimento eficiente no futuro. Nessa versão, o sistema bancário não exerce qualquer papel. Para os economistas que crêem nessa teoria, o sistema bancário é uma "correia de transmissão" absolutamente neutra.
Ora, o que a experiência dos empresários mostrou é exatamente o contrário. A elevação da taxa de juros e a constrição de crédito é altamente seletiva. Há uma discriminação contra as pequenas e médias empresas, que não têm como socorrer-se fora das operações bancárias comuns.
O banqueiro, intuindo que o controle físico do crédito vai desorganizar o sistema produtivo e cortar as vendas de seus clientes e que, simultaneamente, eles serão constrangidos pelo aumento do custo financeiro, o que produzirá um aumento da inadimplência, corta-lhes o crédito com a maior rapidez possível, para que a "onda de iliquidez" também não o atinja.
Quando é isso o que acontece, o que é comum quando as medidas são atrasadas e depois exageradas, os efeitos da política monetária sobre o crescimento futuro são devastadores.
Destrói-se uma boa parte do estoque de capacidade empresarial acumulado nas pequenas e médias empresas e os investimentos não são cortados na ordem de sua prioridade, introduzindo-se distorções alocativas que permanecem por muito tempo.
É isso o que está acontecendo hoje no Brasil. O problema não é novo. Ele apenas mostra as dificuldades escondidas nas políticas macroeconômicas que pretendem controlar os grandes agregados (flutuações do PIB, do nível de preços, do saldo em conta corrente), mas que não levam em conta os problemas microeconômicos, ou seja, onde a vida está. A vida não está no PIB, mas no par de sapato que está na prateleira!
Os efeitos microeconômicos das extravagâncias da política monetária constituem um dos velhos temas da literatura econômica. Mas nunca ninguém imaginou taxas de juros reais de 20% ou 30% ao ano. Aí não há distorção, há devastação.

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