São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995
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Cavallo descarta desvalorizar o peso

DENISE CHRISPIM MARIN

Folha - Qual sua opinião sobre o processo de fusão dos bancos brasileiros e sobre as reformas necessárias neste setor no Brasil?
Domingo Cavallo - Entendo que está ocorrendo um processo muito parecido ao que levamos a cabo aqui na Argentina, a partir de março de 95, quando ocorreu a crise bancária.
Mas não estou suficientemente informado sobre como é o problema bancário no Brasil e como o estão encarando o Banco Central e o governo.
No nosso caso, cerca de 35 bancos, dentre as 205 instituições financeiras que tínhamos em final de 94, sofreram perdas de depósitos. Dessas 35, aproximadamente nove instituições relativamente pequenas e uma de médio porte foram suspensas pelo Banco Central. Depois, foram retiradas suas autorizações para funcionar.
As outras 25 foram compradas por bancos mais fortes. Para induzir esses processos de absorções, nós criamos um Fundo Fiduciário, que ofereceu financiamento aos bancos compradores. Esse processo caminhou bem.
Folha - O senhor acredita que a crise mexicana de alguma forma foi útil para impulsionar a reforma bancária argentina?
Cavallo - Sim, porque, quando criamos a Lei de Conversibilidade, no início de 1991, houve um processo muito rápido de monetização financeira. E todos puderam funcionar sem problemas.
Com a crise mexicana, que provocou a retirada de depósitos do sistema bancário argentino, notou-se que havia instituições que não administraram bem seus ativos ou que tinham custos de intermediação financeira excessivamente elevados. Eram instituições débeis.
Foi justamente essa crise que nos permitiu avançar rapidamente na reestruturação do sistema financeiro. Agora, temos cerca de 165 bancos em lugar dos 205.
Além disso, estão em processo de privatização quase a totalidade dos bancos das Províncias. Depois de concluído esse processo pode haver fusões e aquisições.
Folha - Que modelo bancário se espera, ao final das reformas?
Cavallo - Seguramente vamos ficar com um sistema bancário com menor quantidade de instituições. Mas elas estarão fortalecidas, com maior número de agências e com menores custos operacionais. Isso, na Argentina, é uma coisa muito importante.
Folha - Segundo dados de entidades bancárias, apenas 10% da população argentina é cliente de bancos. Por que isso ocorre?
Cavallo - Nosso sistema bancário não é tão amplo quanto o do Brasil. Isso se deve ao fato de que a inflação e a desmonetização foram excessivamente altas.
Folha - Paul Volcker, o ex-presidente do Federal Reserve (o banco central dos EUA), afirmou recentemente que a Argentina deve aprofundar as reformas bancárias. O senhor concorda?
Cavallo - Seguramente ocorrerão alguns processos de fusões e aquisições adicionais. Além disso, devemos completar a privatização dos bancos das Províncias. Mas o mais importante é o que se há de fazer dentro de cada instituição financeira.
Refiro-me a instituições públicas, como o Banco da Nação Argentina, e também às privadas. Elas têm que se tornar muito mais eficientes, têm que se informatizar, se comunicar melhor. Devem adotar formas de trabalho que reduzam a um mínimo os custos operacionais. Também devem aumentar a cobertura geográfica.
Com esse objetivo, nós introduzimos uma reforma nas regras de liquidez bancária, há dois meses.
Eliminamos os depósitos compulsórios legais e sem remuneração e o Banco Central impôs um sistema de requisitos de liquidez, mais uniforme e remunerado.
Há agora uma concorrência entre os bancos para captar e abrir contas correntes e cadernetas de poupança. Nesse sentido, a presença do Banco Itaú, que já abriu algumas agências na Argentina, foi muito positivo. Isso detonou uma forte concorrência entre os bancos argentinos. E é muito saudável.
Paul Volcker se referiu a tudo isso quando disse que teríamos que continuar com as reformas financeiras.
Folha - Como o mercado reage diante dessas mudanças?
Cavallo - Reage bem. As instituições financeiras mais fortes não haviam conseguido aumentar o nível de produtividade e de eficiência, como ocorreu no resto da economia. Ou seja, o sistema bancário havia ficado um pouco atrasado em relação à economia formal.
Folha - Por que não houve, na Argentina, fusão entre bancos do mesmo porte e do mesmo perfil?
Cavallo - Na Argentina, os bancos grandes -que não são tão grandes se comparados aos brasileiros- não tiveram nenhum problema, em geral. Os que tiveram problemas foram os privados menores e os das Províncias. Esses foram absorvidos por bancos maiores.
Folha - A crise bancária não foi resultado apenas da saída de depósitos do sistema, mas também da má administração?
Cavallo - Alguns bancos tinham custos operacionais muito altos e, portanto, emprestavam a taxas de juros elevadas e a empresas de alto risco. Quando tiveram de vender seus ativos para pagar os depósitos, perceberam que não eram bons. Esse fato se transformou em um problema de qualidade de carteira e de alta insolvência.
Folha - Quantos bancos devem restar na Argentina, ao final deste processo?
Cavallo - Não temos um cálculo prévio. Creio que é um processo que está ocorrendo de forma natural.
Folha - Não há estimativas? Por exemplo, hoje ainda existem cerca de 132 bancos.
Cavallo - Desses 132, alguns são bancos estrangeiros que têm uma única agência na Argentina. Eles continuam se fundindo e recuperando seus negócios. Depois, há possíveis aquisições de bancos das Províncias.
Folha - A conversibilidade vai continuar sendo a regra máxima da política econômica argentina?
Cavallo - A conversibilidade é uma regra que está funcionando de forma excelente. Resolveu muitos problemas e não criou nenhum.
Folha - Não há possibilidade de adoção de um câmbio mais flexível, como o modelo de bandas existente no Brasil?

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