São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995 |
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O comandante errou
CLÓVIS ROSSI Solene, o presidente da República justificou o afastamento de dois de seus auxiliares (o embaixador Júlio César Gomes dos Santos e o ministro da Aeronáutica, brigadeiro Mauro Gandra) com a afirmação de que não poderia pairar "sombra de dúvida" sobre quem quer fosse em seu governo.Bonito, como conceito. Pena que o presidente tenha se entalado numa formidável contradição ao oferecer a chefes militares um almoço que soou como homenagem, desagravo ou coisa do gênero para o brigadeiro Gandra. Se não havia sombra de dúvida, não havia tampouco razão para aceitar a demissão do ministro da Aeronáutica. Se havia -e o seu chefe achou que havia, tanto que aceitou seu afastamento-, então não há razão para que o presidente compareça ao desagravo. Se foi apenas porque percebeu inquietação nas Forças Armadas, conforme o registro de vários jornais, errou mais ainda. Não cabe a elas insubordinar-se, ainda que veladamente, a uma decisão do comandante-em-chefe, o presidente da República. Cabe perguntar se o presidente compareceria a um eventual almoço, jantar ou um mero coquetel em homenagem ao embaixador Júlio César Gomes dos Santos, cujo afastamento se deu exatamente nas mesmas circunstâncias. Ao embaixador, o presidente reservou apenas um "claro que aceito" ante a hipótese, afinal concretizada, de que ele próprio tomasse a iniciativa de pedir a retirada de sua indicação para embaixador no México. Ao brigadeiro, o presidente reservou tempo em sua agenda para um almoço com ares de desagravo. Com isso, fica mais e mais evidente que o projeto Sivam pode tomar as dimensões de bola de neve. Cada vez que o governo se mexe em função do caso, mais se enreda. E não adianta o presidente decretar, por sua conta e risco, que só "corvos" vêem "cheiro de carniça" em toda parte, no Sivam inclusive. A ausência ou presença de cheiros independe da vontade presidencial. A única coisa realmente sensata a fazer é suspender indefinidamente o projeto. Ou, então, correr o risco de passar a impressão de que o presidente se subordina às pressões dos Estados Unidos ou de setores militares. Ou de ambos. Esse tempo parecia destinado aos arquivos históricos. Texto Anterior: O páreo Próximo Texto: A parte e o todo Índice |
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