São Paulo, domingo, 26 de novembro de 1995
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Educação, o maior desafio

MARCO MACIEL

O Brasil tem graves problemas, mas a maioria deles são conjunturais que, com iniciativas oportunas e soluções racionais, podem ser resolvidos sempre e quando haja consciência social que respalde as decisões políticas necessárias. Nenhum exemplo é mais eloquente do que o fim da ameaça inflacionária, do descontrole das contas públicas e da ciranda financeira. Isso conseguimos já resolver com o Plano Real.
A globalização da economia, os processos de integração econômica, os avanços tecnológicos no setor produtivo e a circunstância de que o comércio mundial cresce a taxas mais elevadas do que a produção criam, contudo, desafios que não são apenas conjunturais e que não afetam somente o Brasil, mas tanto as economias desenvolvidas quanto os países em desenvolvimento.
Esses são na verdade os desafios do futuro. A pauta econômica do mundo se centra hoje no binômio emprego e competitividade. Quanto mais integrados os mercados, quanto mais globalizada a economia, maiores são os desafios da competição.
O país, é claro, não está imune a esses problemas, mas no nosso caso, porém, o desafio é maior porque a equação é ainda mais complexa. O nosso binômio é na realidade um trinômio, pois antes o que era uma vantagem comparativa -a mão-de-obra barata, com menores níveis de remuneração- transformou-se numa desvantagem comparativa, que hoje constitui a terceira variável ou a terceira incógnita: a educação. Esse é o nosso verdadeiro desafio e o mais desafiador dos problemas estruturais com que nos defrontamos e que teremos de vencer.
Em todo o mundo a miséria, a marginalidade e a expectativa de vida estão cada vez mais associados à escassez de educação. É a face negra que faz do emprego e da competitividade no Brasil uma consequência marginal de nossas carências na educação.
Um dado apenas ilustra essa realidade. Das 25 mil vagas oferecidas pelo Sine na capital de São Paulo em outubro, menos da metade foi ocupada porque cerca de 50% não atendiam aos requisitos mínimos de conhecimento, de escolaridade ou especialização exigidos.
São os que o presidente Fernando Henrique, num trabalho acadêmico há cinco anos atrás, chamou com propriedade de os "inimpregáveis" do futuro. Resolver o problema da competitividade e superar o desafio do desemprego estrutural no Brasil, portanto, são questões que passam necessariamente pela resolução do problema educacional.
Não basta termos um novo projeto para a educação. Não bastam soluções criativas e métodos modernos de alfabetização em massa. Necessitamos muito mais do que isso -uma mobilização nacional pela educação, por se tratar de uma situação que não se reverte a curto prazo e sem a sua solução não resolvemos os problemas de longo prazo.
Temos de fazer da educação, como as reformas econômicas, um projeto nacional, um programa social, uma prioridade do país e um pacto do Estado. Temos de reverter o rol de todas as prioridades brasileiras.
Essas variáveis -educação e emprego, definidas, aliás, como prioridade do PFL na sua última convenção- devem se transformar de idéias em flama. É preciso mobilização. Mobilizar em favor da educação, porém, não significa apenas lutar por escolarizar.
Temos de melhorar o padrão dos equipamentos de nossas escolas e o nível de profissionalização dos professores, resgatando-lhes a dignidade aviltada por salários irrisórios, incompatíveis com sua função social. Temos de aumentar o tempo de permanência dos alunos na escola e ampliar o calendário escolar se necessário. Temos de pensar em profissionalização, em especialização, em aperfeiçoamento.
É preciso que a escola pública deixe de ser uma instituição do Estado para se transformar numa instituição social -na mais importante delas, na mais incentivada, na mais essencial de quantas o setor público possa manter ou sustentar ou prover. Há que se acabar com a falsa dicotomia entre ensino público e ensino privado. Precisamos do ensino único, de boa qualidade, de alta qualificação, seja público, seja privado.
A proposta de emenda constitucional encaminhada ao Congresso Nacional pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, com exposição de motivos do ministro Paulo Renato de Souza, é um grande passo. É um instrumento essencial que deve ter prioridade, desdobramentos, e que necessita ser materializado com urgência.
A educação não é apenas o primeiro passo, é o passo essencial. É sobretudo o pressuposto indispensável para o exercício da cidadania. O Brasil que consolidou a democracia, recuperou a estabilidade econômica, está preparado, com a legitimidade democrática e a credibilidade social, para responder a esse desafio. Sem isso os países podem viver, mas não prosperam; podem subsistir, mas não progridem; podem sobreviver, mas não lideram.

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