São Paulo, segunda-feira, 27 de novembro de 1995
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Escolas alternativas de direito

JOAQUIM FALCÃO

Tradicionalmente coube às faculdades de direito formar juízes, advogados, procuradores etc. Tradicionalmente, também, o mercado de trabalho sempre reclamou da formação oferecida pelas faculdades. A persistência desses dois fatores -o monopólio das faculdades em formar o profissional jurídico e a insatisfação do mercado com o profissional formado- gerou um impasse histórico. A solução começa a se esboçar. Surpreendentemente, nem o ensino se reformou para atender às exigências do mercado, nem o mercado se acomodou ao ensino. A solução parece ser outra. Vejamos.
O monopólio das faculdades acabou, pelo menos de fato. Surgem, em todo o Brasil, sobretudo nas grandes capitais, escolas de magistratura, de advocacia (da OAB), do Ministério Público etc. Verdadeiras escolas alternativas. As faculdades permanecem como rito de passagem, legalmente obrigatório, e fornecendo a tradicional formação insuficiente. Com honrosas exceções, é claro. Mas, ao passar no vestibular, a próxima preocupação do aluno é vislumbrar para qual escola irá depois de formado. Escolas que garantirão o acesso à maioria dos empregos. Sobre esse sistema paralelo de ensino, faço três considerações.
Primeiro: essas escolas alternativas estão canalizando o esforço e a pressão que segmentos profissionais importantes fariam para reformar as faculdades. A tarefa educacional agora prioritária de juízes e procuradores é consolidar e expandir suas respectivas escolas alternativas. A consequência é óbvia: diminui-se a pressão pela reforma. E a formação insuficiente oferecida ainda pela maioria das faculdades tem maiores chances de se manter.
Segundo: a formação do profissional, que antes era de 4 a 5 anos, agora é de 6 a 7 anos. Aos anos de faculdade, somam-se os de escola de magistratura, por exemplo. Isso aumenta os custos da formação. Custos para o aluno de classe média, que paga a faculdade privada e recebe formação que não assegura bom emprego. E custos para o contribuinte, que, em última análise, paga as faculdades públicas e escolas alternativas. Esse aumento dos anos de formação e seus custos, em princípio dispensáveis, é um desperdício. Em vários países, a tendência é contrária: reduzir os anos obrigatórios de ensino jurídico.
Finalmente, na medida em que essas escolas alternativas são criadas, financiadas e dirigidas pela categoria profissional isoladamente, corre-se o risco de reforçar atitudes e técnicas corporativas. A tendência corporativa cresce e contribui para a crise da justiça em geral. A discussão sobre o estatuto da OAB ilustrou até que ponto atitudes corporativas emocionais comprometem o necessário bom relacionamento entre juízes e advogados.
É cedo para avaliação rigorosa dessas escolas alternativas. Vários países têm suas escolas de magistratura. Com finalidade de especialização, muito mais do que de supridora de deficiências. Mas desde logo é necessário que os líderes das profissões jurídicas continuem a se ocupar do sistema de ensino enquanto um todo e definam pauta comum. A fragmentação do ensino, dividido entre um subsistema legal, obrigatório e insuficiente -as faculdades-, e um subsistema corporativo, optativo e supridor de carências -as escolas alternativas-, será a melhor solução para a crise do ensino?

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