São Paulo, segunda-feira, 27 de novembro de 1995 |
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Para autor, AL teve ditaduras semelhantes
EMANUEL NERI
Para Verbitsky, a diferença entre os dois regimes militares é apenas "aritmética". Enquanto no Brasil morreram 369 pessoas, na Argentina houve cerca de 30 mil mortos -25 mil são considerados desaparecidos. "Aqui (no Brasil) se torturou, se eliminou e pessoas desapareceram", diz o jornalista, que trabalha para o jornal "Página 12", de Buenos Aires. "A situação é algebricamente semelhante", diz. O livro de Verbitsky é uma entrevista com o capitão Francisco Scilingo, da Marinha argentina. Scilingo conta sua participação no extermínio de prisioneiros. Scilingo participou de dois vôos que jogaram prisioneiros argentinos em alto-mar. Segundo o capitão, a operação compreendia várias etapas. Na primeira, uma "vacina" era aplicada em cada preso. Na verdade, tratava-se de um anestésico. Mas os militares diziam aos prisioneiros que era uma vacina, necessária para a transferência deles para um outro presídio, no sul do país. Com o anestésico, os prisioneiros não chegavam a ficar inconscientes. Ficavam apenas sonolentos. Eram transportados de caminhão para uma base aérea, em Buenos Aires. Ali, tomavam um segundo anestésico, mais forte. Com o segundo anestésico, os prisioneiros entravam em sono profundo. Eram jogados no interior de um avião de carga e lançados em alto mar. Muitos desses corpos apareceram depois em praias da Argentina e do Uruguai. O relato do capitão é rico em detalhes. Os vôos ocorriam todas as quartas-feiras. Cada vôo levava em torno de 30 prisioneiros -homens e mulheres. Os oficiais eram obrigados a participar da operação. Scilingo revela que participou de dois desses vôos. Segundo ele, o "rodízio" entre os oficiais era uma forma de comprometer todos e manter sigilo sobre a operação. Lançado em março deste ano, o livro com a entrevista de Scilingo causou grande impacto na Argentina e no exterior. Vendeu 50 mil exemplares e está editado em quatro idiomas. A repercussão do livro levou o governo argentino a reconhecer a prática de tortura e assassinatos durante a ditadura. Os ministros militares fizeram pronunciamentos na televisão pedindo desculpas pelos abusos cometidos. No início deste mês, Verbitsky fez palestra na Folha para promover o lançamento de seu livro, que saiu no Brasil pela editora Globo. Texto Anterior: Confirmada vitória do 'sim' na Irlanda Índice |
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