São Paulo, quarta-feira, 29 de novembro de 1995
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Psicólogos identificam casos de dependência dos computadores

ERIC DEGGANS
DA "'PC NOVICE"

A obsessão transformou Rob, um estudante que só tirava ótimas notas no colegial e pretendia cursar medicina, em um cabulador de aula constante, com boletim fraquíssimo. Foi o fim de suas esperanças de um dia ser cirurgião cardiovascular.
A universitária Tahelia viu-se evitando a companhia de amigos e da família, vivendo à base de refrigerantes de máquina e comida de lanchonete, tudo isso para satisfazer sua necessidade inexorável.
Essas histórias soam como coisa de alcoólatras ou drogados, mas dizem respeito a um fenômeno crescente no mundo das comunicações computadorizadas on line: a dependência incontrolável.
"Eu acordava às 3h da madrugada e ficava imaginando que mensagens do correio eletrônico não estariam me esperando", conta Dinty W. Moore, professor da Penn State University, que descreveu a luta de Rob contra o vício em seu livro sobre a cultura Internet "The Emperor's Virtual Clothes" (As Roupas Virtuais do Imperador), a ser lançado em breve.
"A primeira vez que entrei num Mush (sigla em inglês para Alucinação Compartilhada Multiusuário, jogos on line, de texto apenas, que simulam uma realidade fictícia), passei três dias na frente do computador", conta Rob, que acabou largando a escola e voltando para a casa dos pais, num subúrbio de Pittsburgh.
"Às vezes eu só ficava sentado como um rato de laboratório, olhando para a tela à espera de alguma mensagem", dizia uma mensagem enviada a um endereço da Internet criado para servir de grupo de apoio virtual para quem sofre problemas de dependência da comunicação on line.
Segundo o psiquiatra nova-iorquino Ivan Goldberg, criador do serviço e do termo que descreve o mal -Internet Addiction Disorder (Desordem de Dependência da Internet)- "isso é grave, porque as pessoas perdem o contato com a realidade, não conseguem mais pagar suas prestações, se distanciam dos filhos e se separam das mulheres".
Goldberg não acredita que a palavra "dependência" seja a correta para descrever essa situação. "Quando se trata de heroína ou cocaína, existe uma dependência física, real. A IAD é mais sobre pessoas que usam o computador de maneira patológica para fugir de outras áreas de suas vidas.
"O problema real pode ser uma timidez exagerada ou o distanciamento do cônjuge, e o que as pessoas fazem, ao lidar com o problema de maneira construtiva, é recorrer às comunicações on line", diz Goldberg. "A ênfase aqui não deve ser sobre o perigo de se viciar em computadores, mas sobre como as pessoas recorrem a qualquer coisa para resolver o sofrimento psicológico".
A psicóloga Kimberly S. Young concorda com Goldberg. Ela faz uma lista de indícios da dependência do computador. Com algumas modificações, sua lista poderia soar como um folheto dos Alcoólatras Anônimos.
Kimberley Young criou seu próprio Centro para Dependência Online, no qual só ela trabalha, para tentar atrair recursos e temas para mais pesquisas.
Feifer diz que os viciados on line devem procurar qualquer terapeuta especializado em desordens obsessivo/compulsivas. Eles precisam compreender que têm de buscar apoio para evitar que o computador controle suas vidas.
Mas alguns psicólogos afirmam que passar horas on line nem sempre é sinal de dependência.
"Conheço muitos deficientes físicos que vivem muito fechados em casa e por isso passam seis a sete horas por dia on line", diz Boone. "Mas, no caso deles, é uma coisa positiva. Eles conhecem outras pessoas sem precisar se ater às convenções sociais. Todo mundo tem sede de compartilhar a intimidade com outras pessoas".
A julgar pelo caso de Rob, os psicólogos talvez tenham muito trabalho para curar a dependência dos viciados on line. "Jamais vou conseguir abandonar o computador", diz Rob, reagindo como se lhe tivessem pedido para decepar uma perna. "Um dia eu quero ser transportado para dentro do computador -do meu cérebro direto para a Internet. Tudo bem, pode rir, mas esse é meu sonho".

Tradução de Clara Allain

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