São Paulo, sábado, 30 de dezembro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Emenda constitucional ou golpe de Estado?

JACOB HERSZENHUT

O Projeto de Emenda Constitucional nº 112/95 do deputado José Genoino (PT), que institui um sistema de controle externo do Poder Judiciário, atenta contra vários ditames da nossa Magna Carta.
Enquanto, por um lado, afirma que não interferiria no "mérito das decisões proferidas e nas atividades jurisdicionais", por outro, atribui aos órgãos do sistema o poder de decidir, por exemplo, sobre o orçamento dos tribunais, criação e extinção de cargos da magistratura e serviços auxiliares, criação e extinção de tribunais e varas judiciárias, etc., bem como fiscalizar todo o serviço judicial, recebendo denúncias e reclamações contra membros da magistratura e demais servidores do Judiciário.
É óbvio que tão formidável soma de poderes conferida aos controladores implicaria em ter os juízes e tribunais sob domínio absoluto, com reflexos evidentes e insofismáveis sobre a sua atuação pessoal, funcional e institucional e representaria a implantação de um novo Poder, além dos três já existentes -um superpoder, aliás-, com a função de tutelar o Judiciário, que fatalmente perderia a sua independência e a sua imparcialidade.
E, sem a independência do Judiciário, de seus juízes e tribunais, não há que falar de império ou soberania da lei, considerando-se não existir lei eficaz ou respeito ao ordenamento jurídico, quando os juízes e os tribunais são parciais e submissos.
Portanto, o precipitado Projeto ofende, a um só tempo, clara e diretamente, o Estado Democrático de Direito, o princípio da separação dos Poderes, todo o ordenamento jurídico, nele incluídos os direitos e garantias individuais, conforme estabelecido na Constituição, não podendo sequer ser objeto de deliberação do Congresso, por força do parágrafo 4º, do artigo 60, do diploma constitucional.
Além do mais, tal sistema de controle é inconstitucional tanto quanto o seria a criação de outro novo Poder que se pretendesse instaurar (Eclesiástico, Militar, Sindical, Empresarial, etc.), qualquer que fosse a justificativa de sua instituição, por afetar a forma de governo do Estado, elemento fundamental do regime político, e matéria privada de uma Assembléia Constituinte.
Finalmente, convém não esquecer a advertência de Paolo Barile em "La Costituzione come norma Giuridica", sustentada igualmente por Carnellutti em "Sulla Validitá delle leggi Costituzionalle", no sentido de que "é oportuno nesta altura chamar a atenção sobre aquelas normas particulares constitucionais que (...) constituem verdadeiros e próprios limites ao Poder de Reforma, e não podem, por conseguinte, ser revogadas por emenda constitucional; se uma emenda semelhante viesse a ser promulgada, seria inválida por incompetência de poder constitucional e se, não obstante isto, ela não fosse considerada como tal, e as reações à sua emanação fossem insuficientes, se estaria assistindo a uma verdadeira mudança de regime, a um autêntico golpe de Estado."

JACOB HERZENHUT, é membro da Comissão Permanente de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros.

Texto Anterior: Novo fórum vai receber quinze mil pessoas por dia
Próximo Texto: 95 trouxe esperanças e tristezas para o direito
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.