São Paulo, domingo, 31 de dezembro de 1995 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Entrega de Hong Kong opõe dois sistemas
OTÁVIO DIAS
Por erro da Redação, texto da pág. 1-16 ( Mundo) de 31/12 informou incorretamente a data de devolução da colônia britânica de Hong Kong à China. O correto é 1o. de julho de 1997. À 0h do dia 31 de junho de 1997, o já inexistente Império Britânico receberá seu golpe de misericórdia com a devolução do território britânico de Hong Kong à República Popular da China. O acontecimento é carregado de significado porque Hong Kong é a última colônia de importância de um império que, durante o século 19 e a primeira metade do século 20, espalhava-se pelos cinco continentes. Com a entrega de Hong Kong, os territórios do Reino Unido além-mar ficarão reduzidos a Gibraltar, na Península Ibérica, às ilhas Falkland (Malvinas), no Atlântico Sul, a Bermuda e às ilhas Cayman e Virgens Britânicas, no Caribe, e a mais algumas minúsculas possessões. A devolução, entretanto, não representa apenas o fim tardio do Império Britânico, mas também um embate entre comunismo e capitalismo e um confronto entre um regime autoritário e uma sociedade acostumada à democracia. Há 156 anos sob domínio britânico, os habitantes do território, um dos principais centros financeiros e comerciais do mundo, têm um estilo de vida ocidental e desfrutam de relativa democracia, com um sistema legal independente e liberdades individuais. A China, por sua vez, é a única potência comunista que restou no planeta após o fim da União Soviética em 1991 e dos regimes comunistas do Leste Europeu no final dos anos 80, início dos 90. Com área superior a 9,5 milhões de quilômetros quadrados e a maior população do planeta -cerca de 1,2 bilhões de pessoas-, o país passa no momento por profundas transformações econômicas na direção do capitalismo, mas continua um dos mais fechados em termos políticos. O futuro do território começou a ser discutido pelos governos britânico e chinês no início dos anos 80, devido à proximidade do fim do contrato de arrendamento dos Novos Territórios. Os Novos Territórios, área de 984 quilômetros quadrados incorporada em 1898 à colônia original de Hong Kong, foram arrendados pelo Reino Unido por um período de 99 anos, ao final dos quais deveriam retornar ao domínio chinês. Em 1984, os governos britânico e chinês assinaram a Declaração Conjunta Sino-Britânica, que definiu a devolução não só dos Novos Territórios, mas de toda a colônia. Em contrapartida, o governo chinês comprometeu-se a manter durante 50 anos o sistema capitalista e o estilo de vida da ex-colônia, com base no modelo apelidado de "um país, dois sistemas". O acordo foi confirmado em 1990, com a promulgação da Lei Básica de Hong Kong, espécie de Constituição elaborada pelo governo da China. Não será fácil para o governo chinês lidar com a liberdade política existente no território e limitar sua influência no resto do país. No entanto, caso tente restringir os direitos dos cidadãos de Hong Kong, o governo chinês desrespeitará o acordo feito com os britânicos e poderá prejudicar as economias do território e da China. Problemas já começam a surgir. A China ameaçou cancelar as primeiras eleições parcialmente diretas para o Conselho Legislativo de Hong Kong, realizadas em setembro de 95. O motivo seria o fato de elas não terem sido realizadas de acordo com o que estipula a Lei Básica do território, que entrará em vigor em 1997. A Lei Básica determina que, dos 60 membros do Conselho Legislativo, 20 seriam diretamente eleitos. Outros 30 seriam escolhidos por organizações profissionais de executivos, banqueiros etc. Com isso, o governo chinês pretendia garantir maioria no conselho para os homens de negócios de origem chinesa baseados em Hong Kong. Os dez membros restantes seriam escolhidos de forma indireta. Com o tempo, o número de eleitos diretamente aumentaria. No entanto, depois da repressão ao movimento pró-democracia ocorrido em 1989 na praça da Paz Celestial, em Pequim, o governador de Hong Kong, Chris Patten, foi pressionado a aprofundar a democracia no território. Ele decidiu então aumentar o número de categorias profissionais aptas a eleger membros para o conselho. O governo chinês criticou a decisão e anunciou que pretende dissolver o conselho e realizar novas eleições. A China também criticou a decisão do governo britânico de conceder permissão de moradia no Reino Unido para 50 mil famílias de Hong Kong, assim como a introdução de uma lei de direitos humanos superior à Lei Básica. Texto Anterior: Paz interessa a brasileiros Próximo Texto: 'China vai seguir Hong Kong' Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |