São Paulo, domingo, 31 de dezembro de 1995
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Já vai tarde

LUIZ CAVERSAN

RIO DE JANEIRO - No último dia de dezembro, por mais que se tente, nunca é possível evitar certa ansiedade em relação ao ano que começa no dia seguinte.
Como se sabe, ansiedade nada mais é que medo do futuro, embora haja quem discorde. Um medo razoável, no caso da virada do ano, porque é nesses momentos que vêm à memória as situações desagradáveis do ano que termina e que cada um espera, do fundo da alma, que não se repitam neste ano que chega, novinho em folha.
Numa rápida retrospectiva pessoal, chego a pelo menos dez razões para concluir que 95 já vai tarde e desejar ardentemente que 96 seja diferente. São elas:
1) a expiação pública a que foi submetida a bela Vera Fischer. Jornalistas como carrascos e jornais e TVs como cadafalsos de uma tragédia pessoal que exige um mínimo de respeito.
2) a prisão da Diolinda, a líder dos sem-terra. Revoltante ver a moça ser algemada para a polícia poder fazer sua cena.
3) a guerra de torcedores, que resultou na morte de um jovem. Pelo menos acabaram-se as quadrilhas organizadas que usam uniformes dos times de futebol em São Paulo.
4) a absolvição de O.J. Simpson. A Justiça é cega e étnica.
5) o assassinato de Yitzhak Rabin, exemplo da intolerância atávica da humanidade.
6) o atentado de Oklahoma, que mostra como os americanos são loucos.
7) as bombas de Paris, que mostram como os muçulmanos são radicais.
8) os atentados com gás sarim no metrô de Tóquio, que mostram como os japoneses podem ser fanáticos.
9) a disparada do consumo de crack em São Paulo, que está corroendo a mente e a alma de milhares de jovens.
10) a soltura de PC Farias, que enfim poderá compartilhar com seu chefe, F. Collor, a liberdade e os frutos de sua passagem pelos esquemas do governo.
Poderia ainda citar a fome no sertão, a miséria urbana, os sequestros e as guerras de traficantes, lembrando que essas mazelas não têm jeito, são permanentes.
Mas seria pessimismo demais para quem, afinal, deseja para si e para todos um feliz Ano Novo.

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