São Paulo, domingo, 19 de fevereiro de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Investigadores buscam vacina oral contra o vibrião do cólera

JOSÉ REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Originária da Ásia, o cólera é das mais antigas infecções, registrado em escritos de dois milênios. Seu agente foi descoberto em 1884 por Robert Koch, que lhe deu o nome de "Kommabazillus" (bacilo-vírgula) por sua semelhança morfológica com o sinal gráfico.
Move-se por um flagelo e é hoje designado por Vibrio cholerae. O micróbio não é invasivo, isto é, não penetra o corpo e circula no sangue, mas permanece no tubo digestivo, a cuja mucosa (revestimento interno) adere, nela injetando suas toxinas.
A doença caracteriza-se por profusa diarréia como água de arroz e vômitos que rapidamente desidratam o paciente, cuja morte pode causar. Não obstante o cólera é de cura relativamente fácil, desde que logo no início se providencie reidratação oral ou venosa.
O cólera rapidamente se alastra, provocando pandemias, epidemias e focos endêmicos. O vibrião pode permanecer em indivíduos isolados aparentemente sãos que todavia o disseminam.
É fácil imaginar o perigo que esses portadores aparentemente sãos representam numa época de rápidas comunicações, em que o espaço e o tempo se encurtam cada vez mais entre as pessoas.
Desde 1871 ocorreram sete pandemias de cólera. As seis primeiras foram causadas pelo biótipo clássico, enquanto uma das últimas, iniciada em 1961 e presente até hoje, é devida a um outro biótipo do vibrião chamado "El Tor", um pouco mais benigno.
Essa pandemia foi introduzida no Peru e já atacou cerca de 1 milhão de pessoas, na América Latina. A incidência endêmica do mal nas regiões endêmicas do mundo, associada à emergência de novas epidemias no globo realça a necessidade de vacinas anticoléricas eficazes, segundo John J. Mekalanos e Jerald C. Sadoff ("Science", volume 265, pág. 1387).
Até recentemente, as amostras obtidas dos dois biótipos produziam um antígeno (substância que promove o processo de defesa) chamado "01", mas em 1992 se encontrou antígeno novo, o Bengala ou 0139, próximo do El Tor. Os que procuram desenvolver vacinas anticoléricas têm como ideal produtos capazes de assegurar alto grau de segurança e longa imunidade tanto contra as formas generalizadas quanto em relação aos portadores assintomáticos cujo intestino o vibrião coloniza.
Além disso a vacina deve ser barata porque se destina a aplicação em grandes extensões em geral desprovidas de recursos de saneamento básico. Surge a pergunta: se a doença é relativamente fácil de curar (reidratação), por que cuidar de vacinação? É que o cólera é explosivo, atacando ao mesmo tempo milhares de pessoas, tornando a rede hospitalar insuficiente para o atendimento e obrigando por vezes a improvisações que podem agravar o quadro geral.
Apesar de mais de uma década de pesquisa, são ainda precários os resultados na produção de vacinas eficazes. Acham-se abandonadas as vacinas parenterais (injetadas) porque a imunidade tem sido precária. As atenções fixam-se atualmente em vacinas orais, que imitam o processo de infecção. Elas têm sido obtidas por engenharia genética. Vacinas desse tipo têm sido aplicadas em mais de 60 mil voluntários revelando plena segurança e capacidade de imunização. Existem, porém, algumas restrições quanto à sua eficácia prática.
A essa espécie de vacina oral morta opõe-se outro tipo de vacina também oral, porém viva e atenuada, que parece oferecer vantagens técnicas. Espera-se que daqui a poucos anos vacinas eficientes, tanto inativas quanto vivas, se achem disponíveis como elemento de saúde pública.

Texto Anterior: Mundo moderno traz para dentro do lar várias doenças e alguns mitos
Próximo Texto: Nos passos de Mário
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.