São Paulo, segunda-feira, 20 de fevereiro de 1995
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O milagre da multiplicação

O ministro do Planejamento, José Serra, em reportagem publicada há pouco nesta Folha, chamou a atenção para uma distorção gigantesca e de custo considerável para o país, mas que normalmente passa despercebida da população, mascarada por sofismas que escondem obscuros interesses. Trata-se da multiplicação de municípios.
Segundo o ministro, desde que a Constituição foi promulgada em 1988, cerca de um milhar dessas unidades administrativas foram criadas no país, elevando o total a mais de 5.000. Esse processo de geração espontânea, que passa por um plebiscito, sem dúvida travestiu-se em muitos casos de apaixonadas defesas da singularidade histórica e cultural desta ou daquela área e da necessidade de autonomia para que seus problemas fossem tratados com a devida atenção.
É até possível que muitos incautos tenham apoiado campanhas em prol de novas cidades em função desses argumentos. Mas seria uma ingenuidade imperdoável ignorar que os motores de tais iniciativas visavam na verdade a objetivos muito menos nobres.
A criação de um novo município tem como efeito imediato e inevitável um inchaço da máquina administrativa, com um igualmente infalível aumento dos gastos públicos. Afinal, criam-se novos cargos de prefeito, secretários e vereadores e uma nova estrutura municipal, que terão de ser sustentados, é claro, pelo contribuinte. E a perspectiva desses novos postos conquista facilmente a simpatia de políticos e pretendentes a políticos para a causa da independência municipal.
Mais ainda, essas novas cidades muitas vezes são criações artificiais sem qualquer condição de sustentação econômica, condenadas a serem dependentes, pedintes às portas do seu Estado e da União.
A situação do Brasil impõe hoje uma reforma profunda do poder público que caminha na direção oposta à dessa orgia de novos alcaides, edis e cia. O milagre da multiplicação dos municípios, que promete aos crédulos benefícios de toda sorte, na verdade só traz mais custo para o bolso de todos nós.

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