São Paulo, domingo, 26 de fevereiro de 1995
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Calouro é pretexto para show de jurados

FERNANDO SALÉM
ESPECIAL PARA O TV FOLHA

Alô auditório!
Que eu me lembre não tenho nenhum colega músico que tenha começado sua carreira num programa de calouros. Na "Buzina do Chacrinha" a produção selecionava as figuras exóticas, que semitonavam deliciosamente durante alguns segundos até que o Velho Guerreiro detonasse mais uma sensacional piada nonsense e premiasse o sujeito com um abacaxi.
Desconstruindo a imagem séria de um programa de calouros, ele desmistificava a antiga idéia (herança da rádio nos anos 50) de que o caminho para o estrelato estava naquela oportunidade única.
Minha cultura musical, um tanto quanto promíscua, passa desde moleque por todos esses programas. Flávio Cavalcanti, Bolinha, Raul Gil, Barros de Alencar. Nesses, até parecia existir alguma pretensão de revelar talentos. Notas maiores e prêmios em grana para os mais corretos, afinados, empostados, com jeito de cantor da noite ou cover de algum notável.
Eram Bethânias, Robertos e Caubis atrás de uma "chance". Quando o "cão didático", como dizia Barros, era estiloso e esquisitão, só servia de escada para os jurados. Isso pouco mudou nos sobreviventes do gênero.
Ah! os jurados... Zé Fernandes, Elke Maravilha, Leila Diniz, Wilza Carla, a genial Aracy de Almeida e os atuais Leão Lobo, Nelson Rubens e Décio Pitinini. Neles mora o segredo dessa longevidade. Como Chacrinha, esses tipos revelam, na sua transparência "trash", que aquilo é pura diversão. Preconceitos expostos, rusguinhas, cantadas entre si dão a sensação de que o palco verdadeiro é ali, calouros são pretexto.
A banda de um programa assim é atração à parte para quem tem ouvidos aguçados. Seu esforço de acompanhamento é magistral, pulando compassos, abreviando notas ou solando a melodia como quem joga uma bóia para alguém que se afoga. São treinados para errar, têm enorme senso rítmico e maravilhoso humor. Play-back, nem pensar. Esfriaria o clima.
Edson "Bolinha" Curi ("melodia de sucesso que o meu povão gosta") anda sumido. Nas suas radicais camisas tropicalistas, ele fez estilo. Perdeu força sem seu auditório.
Como um "sampler", a TV vive de imitar a si mesma. Infelizmente ninguém mais se arriscou a reinventar o gênero. Por que não? Reggae, metal, blues e baião, um juri excêntrico, drag queens devidamente coreografadas e o "Novo Guerreiro" divertindo a moçada.
Pouca gente sabe que os meus amigos Marcelo Fromer e Sérgio Britto, dos Titãs, levaram uma antológica buzinada do Eterno Guerreiro e até hoje se orgulham do abacaxi.

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