São Paulo, segunda-feira, 27 de fevereiro de 1995
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'Débi & Lóide' resgata tradição da comédia

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Filme: Débi & Lóide - Dois Idiotas em Apuros
Produção: EUA, 1994
Direção: Peter Farrelly
Elenco: Jim Carrey, Jeff Daniels, Lauren Holly, Mike Starr
Onde: a partir de hoje nos cines Ipiranga 2, Center Iguatemi 1, Bristol e West Plaza 3

"Débi & Lóide" (Dumb & Dumber) é um sopro de humor bruto num tempo em que a comédia foi tomada de assalto pela inteligência, pelo bom-tom, pela paródia metida a culta.
Isso se deve em boa parte a Jim Carrey, ator que estourou em "O Máskara" e reata com uma tradição que vem do cinema mudo e hoje parecia extinta.
Carrey tem o instinto e o tempo do humor. Faz rir com a mais insustentável das "gags" verbais, domina a cena e possui o dom da mímica. Falta-lhe livrar-se um pouco da influência de Jerry Lewis (não renegá-la) para que essas qualidades dêem a ver, finalmente, um cômico totalmente original.
A história de "Débi & Lóide" em princípio daria vontade a qualquer produtor de atirar os roteiristas (Peter e Bobby Farrelly e Bennett Yellin) pela janela. Não por seus defeitos —que existem—, mas por suas qualidades.
Num momento em que Hollywood dedica-se a fabricar variantes das mesmas fórmulas, os Farrelly surgem com a história de dois amigos idiotas, Débi (Carrey) e Lóide (Jeff Daniels), perfeitamente incapazes de decifrarem os sinais com que se defrontam.
E, claro, marginalizados do sonho americano. Quando o filme começa, Débi é um chofer de limusine que se apaixona pela garota (Lauren Holly) que conduz ao aeroporto. A moça "esquece" sua valise antes de subir no avião. Débi, solícito, pega a maleta.
Equívoco fatal. A mala estava cheia de dinheiro para pagar um resgate. Fora deixada lá para ser apanhada pelos sequestradores.
Está criado o quiproquó. Enquanto os gângsteres perseguem Débi e Lóide, a dupla tenta reencontrar a jovem. A trajetória será pontuada por catástrofes nem sempre pequenas, produzidas pela idiotia dos protagonistas.
Na tela, elas se convertem em um festival de quedas, tapas, sandices, insânias em geral. Enfim, tudo que se pode esperar do humor mais vulgar. Escorrega-se nele a toda hora. Raramente se cai.
Entre os defeitos do filme, seria possível listar uma série de grosserias desnecessárias. O mais grave deles, porém, é o fato de dar a Carrey e Daniels o mesmo estatuto. Seria melhor definir Daniels como o "escada" (o que prepara as "gags") da dupla.
Essa indiferenciação leva, sobretudo na primeira metade do filme, a uma superposição de funções e a um ritmo um tanto descontrolado. Na parte final, a idiotia de Daniels segue seu próprio caminho e as coisas melhoram.
Esses problemas estão longe de estragar um filme que reata com um tipo de comédia que parecia perdido há uns 20 anos, em que adultos e crianças riem juntos e, às vezes, a bandeiras despregadas.
Vale assinalar que Peter Farrelly (diretor de primeira viagem) tem bom sentido do tempo de uma "gag" e a audácia de encher os créditos de abertura de solenes erros ortográficos.
"Débi & Lóide" pode não ser genial, mas, em matéria de irmãos, dá para preferir os simpáticos Farrelly aos empolados Coen.

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