São Paulo, quarta-feira, 1 de março de 1995
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Decreto de Maluf é inconstitucional

LUIZ BENEDICTO MÁXIMO

A polêmica em torno da constitucionalidade ou não do decreto municipal nº 34.836, de 31 de janeiro de 1995, que proíbe o fumo em bares, restaurantes e estabelecimentos afins de São Paulo, teve grande repercussão nos municípios do Estado e provocou uma série de consultas ao Cepam, obrigando o corpo técnico-jurídico do órgão a se debruçar sobre o assunto, cujo disciplinamento, por competência expressa na Constituição Federal, está afeto aos municípios.
Na análise do Cepam, o decreto é inconstitucional, pois ao pretender regulamentar a lei nº 10.862/90, o prefeito Paulo Maluf exorbitou dos limites da lei, que apenas restringe o tabagismo em locais específicos, determinando a reserva de espaços a não-fumantes, a fim de que tenham sua saúde e conforto preservados. Ao regulamentá-la, Maluf ampliou a proibição de 50% para 100%.
Como ato administrativo de natureza normativa, um decreto jamais pode ultrapassar, ir além, inovar ou complementar uma lei, mas tão-somente explicá-la, facilitar seu entendimento. O poder regulamentar não pode ser confundido com o poder legislativo, que deriva da vontade do povo, externada pelos órgãos dos poderes Legislativo e Executivo, que se submetem às regras do processo legislativo atendendo ao disposto no ordenamento constitucional.
A competência privativa do chefe do poder Executivo para expedir decretos e regulamentos encontra seus limites na própria lei, sob pena de ofensa a direitos e garantias fundamentais do indivíduo. Só a lei cria direitos e obrigações. Só ela pode obrigar alguém a fazer ou deixar de fazer alguma coisa (artigo 5º da Constituição Federal).
Vale ressaltar que a lei nº 10.862/90 não sofreu qualquer questionamento, até o momento, seja por parte do fumante, seja por parte dos proprietários dos estabelecimentos dessa natureza, visto ser indubitável competir ao município legislar sobre assuntos de interesse predominantemente local.
Para os municípios que desejarem disciplinar corretamente o assunto, com restrições ao uso de cigarros, charutos e cachimbos em locais públicos, indicamos a lei como a espécie normativa adequada, atentando-se para o não-tolhimento ao direito individual. A lei disporá em nome da coletividade, no exercício da atribuição de polícia administrativa, inclusive prevendo a aplicação de penalidade administrativa de natureza pecuniária, sem a qual a proibição seria inócua, e em nome da saúde pública, seja pelo fumante direto, seja pelo indireto, aquele que fuma indiretamente, obrigatoriamente, em locais públicos fechados.
Publicada a lei restritiva de direitos e geradora de obrigações, a sua regulamentação será feita pelo prefeito, mediante decreto objetivando a fiel execução da lei, sem inovar a ordem jurídica estabelecida, ampliando ou mesmo restringindo as disposições que nela se contenham, visto que tal proceder configurará abuso de poder.

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