São Paulo, quarta-feira, 1 de março de 1995
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Nova York é mito em extinção

DO "EL PAÍS"

Robert Hughes questiona o mito de Nova York como centro artístico internacional e ressalta a falta de ambição de muitos dos jovens artistas.
"Nova York segue sendo um centro de galerias e de artistas; o que acontece é que sua elite artistica já não domina nem dita as normas da arte internacional. O problema é que a New York Art Scene dos últimos 15 ou 20 anos dependia da tal maneira do mercado que quando este se retraiu a coisa se acabou. Mas como Nova York já não é mais o centro, não há nenhuma outra cidade que o seja; o centro já não existe em um mundo mais complexo e internacional. Por outro lado, creio que uma das tragédias para os artistas jovens nos Estados Unidos é que o conceito de verdadeira ambição cultural, que inclui uma relação com a arte clássica, ficou quase obsoleta pela repetida retórica vazia sobre poder, falocracia, feminismo etc., baseada em uma leitura ridiculamente estreita das imagens do passado que ignora sua dimensão estética. Isto faz com que os jovens artistas desconfiem de qualquer tipo de arte elevada; a idéia do mestre é suspeita porque para estes grupos implica noções de autoritarismo masculino agressivo, explícitas ou subjacentes."
Hughes realça estas opiniões referindo-se ironicamente a um dos artistas mais cotados da década passada. "Durante os anos 80 se produziu uma grande quantidade de retórica desmedida, cujo exemplo perfeito, até bufonesco, são as declarações de Schnabel dizendo que ele era um continuador da obra de Tiziano, Caravaggio, Giotto e Van Gogh, e o artista mais parecido a Picasso. Estes delírios são parte das razões pelas quais ninguém leva Schnabel a sério. Em qualquer caso, até os anos 80 os artistas da escola nova-iorquina invocavam figuras do passado, mas agora ninguém sequer tenta e o resultado é uma espécie de infecção cultural de baixo grau, como a herpes, que nunca chega a ser verdadeiramente perigosa como a Aids."
Hughes responsabiliza em grande parte o deficiente sistema educacional pela má qualidade da arte norte-americana atual. As escolas de belas-artes norte-americanas, diz, estimulam um ensino "terapêutico", ou seja, o desenvolvimento de uma personalidade social e psicológica em vez de técnicas pictóricas clássicas fundamentais para um artista.
A noção atual de que a prática de desenhar modelos humanos ou naturais é hostil à criatividade é uma ficção para Hughes, que afirma que as escolas de arte se transformaram em lugar de crianças pequenas que ignoram que os criadores da arte moderna haviam estudado nas escolas clássicas e utilizaram com fins próprios estas técnicas em suas obras.
Outro aspecto do ensino criticado por Hughes é a substituição de uma cópia da obra de arte pela obra em si nas escolas de arte, o que desnaturaliza a arte contemporânea : "As reproduções reduziram, e em alguns casos destruíram, o sentido único e a escala particular das obras de arte, a presença física que Walter Benjamin chama sua aura".

Tradução de CLAUDIA ROSSI

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