São Paulo, quinta-feira, 2 de março de 1995
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Bart de Baere defende proposta multicultural

KATIA CANTON
ENVIADA ESPECIAL A JOHANNESBURGO

O belga Bart de Baere é um dos mais poderosos nomes da arte internacional. Curador geral, ao lado de Jan Houet, da última "Documenta" de Kassel, Bart é presença fundamental em qualquer mostra internacional de arte. Jovem e ambicioso, ele é tido como um "inventor de modas". Ele prefere se definir como um "detector de tendências".
Assinou, ele mesmo, a curadoria do espaço reservado ao país de Flandres. Em sua escolha sui generis, os belgas Rik Moens, Honoré d'Or e Hugo Debaere expõem junto com os artistas negros sul-africanos Albert Munyai e Billy Mandini. Detalhe: os dois pertencem à tribo de Venda, localizada no norte da África do Sul e considerada marginal pelos outros grupos negros. Trabalhando ao lado dos sofisticados belgas, poderia haver uma linguagem comum?
O resultado, uma instalação idealizada por De Baere e realizada a dez mãos, é um vale-tudo estético que sobrepõe esculturas de madeira e construções com tecido costurado (feito pelos africanos), com baldinhos e bonecas de plástico, sacos de lixo, bolinhas de algodão, um saco gigante pendurado no teto e até forminhas de papel (feito pelos belgas). Sobre esta experiência, De Baere falou à Folha com exclusividade.

Folha - O que você fez nessa curadoria?
Bart de Baere - Resolvi trabalhar numa colaboração de fato. Pedi aos artistas belgas que chegassem à África uma semana antes da montagem da Bienal para conviver com os artistas em Venda, ao norte do país. Na chegada a Johannesburgo eles mostraram juntos o espaço, com objetos comuns ao cotidiano de cada um, mas que, combinados, formaram uma poética. Albert Munyai fez furos num cobertor pendurado e ali cortou bonecos e estrelas —fez o céu! Billy Mondini usou um pneu ao redor do pescoço de um boneco para comentar a opressão racial de seu país.
Folha - Qual o grande papel dessa Bienal?
Artistas como Alberer e Billy foram considerados loucos. Acabaram se envolvendo com drogas, criminalidade, hospitalização porque foram pressionados a se tornarem marginais. Agora têm a chance de mostrar seu trabalho. Há que se construir um mercado para sua arte e isso é conseguido através da exposição internacional. Por que você acha que a arte brasileira está tão forte internacionalmente? É porque há uma Bienal em São Paulo e todos podem ver o que os brasileiros estão fazendo.
Folha - Como se define essa bienal em relação às outras bienais e a Documenta?
É um treino para os olhos. Por outro lado, essa não é uma Bienal coerente, com uma proposta e um tema central de curadoria, como é o caso da Documenta. Talvez o ideal seja contornar as duas tendências.

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