São Paulo, domingo, 5 de março de 1995
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Atentado ainda faz Seles sonhar com facas

DREW MACKENZIE
DO 'WORLD WIDE'

A tenista Monica Seles, 21, ex-número um do mundo, tem terríveis pesadelos com a facada que destruiu sua vida.
Seles, que se transformou em verdadeira reclusa, está se submetendo a tratamento psicológico para superar seu receio de que o atentado aconteça outra vez.
A tenista não consegue perder o medo de que algum lunático pule da multidão e a ataque novamente. Está sem coragem suficiente para retornar ao circuito de tênis.
Seles, cuja ausência foi mais uma vez sentida no Aberto da Austrália de 95, disse que sonha com facas quase todas as noites.
"Não consigo vencer meus temores. Parece que nunca vou me livrar dessa angústia", afirmou.
"Acordo suando quase todas as noites e não consigo voltar a dormir", contou. A mãe da jogadora costuma ficar ao seu lado horas a fio, durante a noite, tentando afastar o pânico.
"Provavelmente o homem que me atacou não perdeu um segundo de sono", afirmou a ex-campeã.
Seles, que já venceu diversos torneios do Grand Slam, foi apunhalada pelas costas em abril de 93, em Hamburgo, Alemanha, pelo espectador Gunter Parche, 39.
Milhões de pessoas viram a cena pela televisão.
Parche fez o ataque sozinho, utilizando uma faca de cozinha de aproximadamente dez centímetros, com o objetivo de facilitar a tarefa da alemã Steffi Graf, que tentava voltar a ser a número um.
Parche teria continuado a apunhalar Seles se não tivesse sido contido por outro espectador.
A ex-campeã, assustada com a experiência, tenta superar os danos psicológicos.
"Eu explodo com coisas pequenas. Tenho acessos de fúria incontroláveis", revelou a tenista.
"Está tudo na minha cabeça —as horríveis memórias daquele indivíduo me esfaqueando. Quando eu faço jogging, é só ver um homem que eu tremo por dentro", lamentou.
Parche recebeu uma pena leve pelo crime —dois anos de prisão, com direito a cumprir a pena em liberdade condicional.
A sentença causou controvérsia.
Segundo Monica Seles, ela ficou muito desapontada com o veredicto. "Perdi a crença na humanidade", afirmou.
Após o atentado, a tenista se apaixonou pelo professor alemão Carsten Malessa, que impediu que Parche a matasse e a confortou até que os médicos chegassem. O romance teve curta duração, porque ela mora nos Estados Unidos.
Dois anos atrás, Seles estava no topo do mundo. Depois de ter destronado Graf, ela parecia imbatível.
Estava ganhando um torneio atrás do outro, dando a impressão de que bateria o recorde de títulos individuais em competições do Grand Slam, que é de Martina Navratilova.
Ela havia ganho US$ 5 milhões em quatro anos de carreira e estava ganhando outros milhões com contratos publicitários.
Seles tinha uma vida de estrela e contava com diversos amigos da alta sociedade, como Donald Trump, Michael Fox, Sheena Easton e Geena Davis.
Em Melbourne, em 92, a ex-campeã, que gostava de se vestir de maneira a chamar a atenção e tinha um comportamento rebelde, chegou a ser chamada de a Madonna do tênis.

Excesso de peso
Antes do atentado, seu pensamento era o de seguir carreira no cinema quando interrompesse suas atividades na quadra.
A ex-campeã, porém, ganhou outro problema, além dos danos psicológicos: o excesso de peso.
Cinco meses atrás, foi difícil reconhecê-la num evento de caridade. Ela estava mal-vestida, desleixada, usando um vestido largo para esconder a gordura.
Deprimida, Seles começou a comer 'junk food' e doces —e ganhou cerca de 14 quilos.
Depois que as fotos da estrela, com seus quilos a mais, se espalharam pelo mundo, Seles se escondeu ainda mais e evitou voltar a aparecer em público, embora ainda atenda um telefonema ou outro da imprensa.
A tenista, que nasceu na Iugoslávia, está morando na casa que comprou para seus pais, em Sarasota, Flórida. A casa tem uma quadra de tênis nos fundos.
Seles já perdeu a maior parte dos quilos que ganhou através de um trabalho diário com uma equipe de especialistas que inclui um fisiologista.
Ela também conta com a ajuda de um psiquiatra e um psicólogo, que a estão encorajando a voltar às competições.
Nick Bollettieri, seu ex-treinador, acredita, porém, que ela talvez nunca mais volte às quadras. "Ela me escreve constantemente, mas nunca fala de tênis", afirmou.
Um jornalista da revista "Tennis", em Nova York, afirmou que Seles se tornou um mistério. "Nós não sabemos como ela está. Ninguém sabe quando ela vai voltar —se é que vai voltar", afirmou.
Um representante da empresa IMG, que administra os negócios de Seles, avisou a imprensa que a tenista está treinando em casa. "Nós esperamos que ela faça um pronunciamento sobre sua carreira em breve."
O mundo do tênis está esperando com ansiedade uma definição da tenista. Seles, porém, pode ter dado uma dica sobre seus planos futuros quando afirmou o seguinte: "Eu não quero ser lembrada pelo atentado que sofri, eu quero ser lembrada pelo meu jogo".

Tradução de João Carlos de Assumpção

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