São Paulo, terça-feira, 7 de março de 1995
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Rumos do plano ficam obscuros com mudanças

JOSÉ ROBERTO CAMPOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois de insistir durante meses que o Brasil não é o México, o governo brasileiro reconheceu que a crise provocada pela virtual falência mexicana é grave, suas consequências são muito maiores do que as previstas e seu impacto alarmante.
Em 82, o México provocou a interrupção dos fluxos de capitais internacionais. Em outro cenário, a mesma coisa pode acontecer agora.
A política cambial sustentou o Plano Real até hoje. A partir de dezembro, as reservas de moeda forte brasileiras começaram a sangrar —US$ 1,18 bilhão em dezembro, US$ 1,4 bilhão em janeiro— e dados privados indicam que os US$ 40 bilhões disponíveis em outubro haviam se tornado US$ 36,1 bilhões em janeiro.
O país tinha em janeiro cerca de US$ 17,8 bilhões de capitais externos nas Bolsas. Seus donos estão hoje extremamente apreensivos com o que fazer com ele. Estes capitais fugiram rapidamente do México, estão deixando o Plano Cavallo em apuros na Argentina e sua movimentação para fora do Brasil produziu a primeira grande mudança do Plano Real, após seus oito meses de vida.
O mercado financeiro internacional dá sinais de alerta cada vez mais frequentes. É capaz de surpreender até os economistas do Banco Central americano. Nem uma semana se passou após seu presidente, Alan Greenspan, afirmar que não seria mais necessária a escalada dos juros, perseguida tenazmente desde março, o dólar sofreu enormes baixas. Nova alta dos juros tornou-se possivelmente necessária. Ela tende a agravar o nervosismo do mercado financeiro internacional e acelerar a saída de capitais de países como México, Argentina e Brasil.
A principal consequência para o Plano Real será um aumento das pressões inflacionárias. Após montar uma estratégia de conter preços internos com a ameaça de importações, o governo, com a fixação do regime de flutuação do câmbio, encareceu-as em 3,6% (considerando-se o piso informal de 0,83 para compra e o novo de 0,86).
O momento para a mudança é ruim —boa parte dos contratos cujo vencimento foi obrigatoriamente esticado a um ano, com o início da URV em março de 94, começam a ser reajustados agora.
Ao mexer na taxa de câmbio, outros peões do tabuleiro econômico tendem a se modificar. O mesmo motivo que levou às modificações de ontem no câmbio —fuga de capitais— colocam no horizonte a elevação das taxas de juros (com o efeito colateral de esfriar o consumo, preocupação obsessiva da atual equipe econômica).
A mexida no câmbio não é necessariamente traumática. As exportações podem decolar mais rapidamente, o movimento dos preços para cima pode reduzir um pouco o consumo e o ritmo das importações arrefecer.
As mudanças, entretanto, obscurecem os rumos do Plano Real —até agora claros. A equipe econômica de FHC fechou o ano pregando a necessidade de déficits comerciais. A nova equipe de FHC passou a dizer o oposto. Um dos pontos básicos do programa era com a abertura de mercado colocar a concorrência como parâmetro para a fixação dos preços. Tem voltado atrás com insistente frequência nos dois primeiros meses de gestão de FHC.
A política econômica está mudando e a cada guinada a equipe diz que age preventivamente. A cada reação, porém, seus objetivos parecem ficar menos nítidos. Produzir superávits comerciais, controlar consumo via juros, tentar fazer avançar a privatização e aguardar a revisão constitucional parece um retrocesso —ao início da gestão de FHC no Ministério da Fazenda de Itamar.

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