São Paulo, terça-feira, 7 de março de 1995
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Sangue via satélite

Depois de rendido por 12 policiais, um assaltante foi morto no sábado, no Rio. A cena do crime, manchete nas TVs americanas e européias, durou alguns segundos. Olhada com algum cuidado, resume uma história de anos de truculência e despreparo da polícia.
O soldado autor dos disparos alegou legítima defesa. A vítima teria sacado uma arma escondida, sinal de que a revista do preso foi incompetente. Os tiros mataram, quando poderiam ter apenas imobilizado o assaltante. Por fim, o comandante dos PMs, o governador do Estado, disse que o soldado pode ter sido "presa da comoção que abala a razão". O argumento já serviu para justificar crimes passionais e massacres como o do Carandiru.
Antes mesmo que a perícia descubra por que o assaltante precisou morrer, mesmo cercado por uma dúzia de homens, a polícia já deve ser condenada por incapacidade. E não só a do Rio de Janeiro.
A morte do assaltante é ao mesmo tempo exemplar e corriqueira. Na quarta-feira passada, guardas civis paulistanos mataram uma mulher. Ela fugia em uma moto supostamente roubada. O delegado do caso disse que a mulher morreu por ter se assustado com a perseguição: "É uma questão cultural. As pessoas têm medo da polícia".
O delegado atira certo com balas tortas. De fato, foi criada a cultura do medo. Ela será alimentada enquanto não houver mais treinamento, controle de tiros e avaliação de quem os dispara, como nos EUA e Japão. Esse cuidado já ocorreu em 1993 em São Paulo e inverteu a atitude da PM, que matava três vezes mais do que feria, o inverso de uma cidade como Nova York.
É certo que a profissão de policial é sacrificada. Por três salários mínimos, os soldados se arriscam em tiroteios. Ao evitar fuzilarias, no entanto, pode ser que até eles fiquem mais seguros.

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