São Paulo, sexta-feira, 10 de março de 1995
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O que tem o Brasil com o top quark?

JOSÉ SARNEY

O fim do século coincide com a mais almejada descoberta do homem no mundo da física: a partícula fundamental do universo, o top quark. Fui, quando presidente da República, em setembro de 1989, ao Fermilab, onde foi realizada a grande descoberta, no acelerador de partículas de Chicago.
A primeira pergunta que se faziam aqueles homens que ali trabalhavam era a de saber o porquê daquela visita de um presidente de um país da América Latina, região que não está inscrita entre as que se interessam por tecnologias de ponta e tem problemas bem maiores.
O diretor do Fermilab perguntou-me o motivo de minha visita. Disse-lhe que, "como país em desenvolvimento, o Brasil aprendeu com esforço que a modernização não se origina apenas na determinação da sociedade de transformar-se e aperfeiçoar-se. Deter tecnologia é estar no centro das decisões. Houve um tempo em que território era sinônimo de poder. Hoje, o poder se confunde com o saber".
Agora, quando leio que no Fermilab chegaram a essa fundamental descoberta para a humanidade, penso no Brasil, nos jovens cientistas brasileiros que ali estavam e estão no Fermilab participando dessas pesquisas. Atualmente, a libertação está no conhecimento, e o nosso país não pode estagnar nos problemas da conjuntura, perdendo a visão da estrutura. Durante o meu governo, triplicamos os investimentos em tecnologia, mandamos cerca de 90 mil bolsistas estudarem e trabalharem em grandes centros de excelência do mundo inteiro.
Investimos no financiamento de projetos de chips e fibras óticas, silício eletrônico, cerâmica de alta condutividade, combustível para satélites, supercondutores, laboratório de testes de satélite, enriquecimento do urânio, biotecnologia, Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos, novos materiais, química fina, mecânica de precisão, supercomputadores, Laboratório Nacional de Computação Científica, engenharia de materiais e otimização de sistemas, a primeira etapa do acelerador linear de elétrons, Laboratório Nacional de Luz Sincroton, a Base de Lançamento de Foguetes de Alcântara, enfim, uma permanente sensibilidade para com os problemas fundamentais do futuro, que são ciência e tecnologia.
No Grupo dos Presidentes da América Latina propus a criação de um organismo, tipo Projeto Eureka, da Comunidade Européia, que unisse nossos cérebros e que fosse um grande centro científico no continente.
O fim do século exige o fim do monopólio do saber, somente objeto de comércio e na mão dos países que dominam tecnologias. O Brasil jamais será o grande país que nós sonhamos se não nos dedicarmos agora, e logo, a essa tarefa redentora de estar presente nesse campo decisivo, que é o conhecimento humano, em que se jogam os destinos da história.
A educação passa a ser, nessa paisagem, o mais dramático e inadiável de todos os problemas do Brasil. Os físicos brasileiros que estão em Chicago, no Fermilab, são o símbolo de um país que não deseja ficar como espectador do conhecimento humano, mas participante e engajado.

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