São Paulo, sábado, 18 de março de 1995
Próximo Texto | Índice

Concurso de beleza divide negros

MAURICIO STYCER
DA REPORTAGEM LOCAL

Um concurso de beleza realizado esta semana em São Paulo conseguiu desagradar um dos mais tradicionais militantes do movimento negro da cidade.
A intenção do "Beleza Negra 95" era da melhores. Cansada de só ver modelos negros em papéis menores na publicidade, a produtora Rita Cássia Santos resolveu radicalizar: organizou um concurso para eleger os negros mais bonitos de São Paulo e ainda colocou no palco três lindas loirinhas no papel de figurantes.
"Negro só é chamado para fazer figuração. Ou participar de evento afro. Quero ver negros fazendo propaganda de margarina e de carros", justificou Rita, 32.
O evento, que lotou na última terça-feira a boate "black" Balafon, irritou o SOS Racismo, um dos mais conhecidos grupos de combate ao preconceito racial.
"O nome do concurso é 'beleza negra', mas para ganhar precisa ter os traços da mulher branca. Tem que ser magra, com lábios finos, absolutamente diferente de uma mulher negra", protestou a advogada Sonia Maria do Nascimento, coordenadora do SOS Racismo.
"Esses concursos, em vez de valorizar a mulher negra, ainda criam problemas para a auto-estima dela", acrescentou Sonia.
Os vencedores do concurso foram a estudante Kelly Cristina Camilo, 17, e o auxiliar administrativo Sandro de Oliveira, 23. "A raça negra é a mais bela do mundo", exultava Kelly ao final.
Só uma modelo participou do júri, a bela Isis Venâncio, 23, que recentemente apareceu em primeiro plano num comercial da cerveja Antarctica: "Para ganhar close em anúncio, uma modelo negra tem que ter traços de branca".
A organizadora do Beleza Negra 95 acha que o concurso serve justamente para afugentar esse preconceito. "Precisamos 'vender' uma imagem moderna do negro, do negro que é consumidor, que é de classe média e está bem informado, e não mais essa coisa de raízes", disse Rita Cássia.
No seu esforço de levantar a moral "black", Rita fez o público se divertir com um grupo de desengonçados modelos loiros.
Entre um desfile e outro, três mulheres e dois homens brancos entraram no palco, primeiro dublando um grupo de rap, depois imitando a timbalada de Carlinhos Brown e, por fim, fingindo pertencer a uma escola de samba.

Próximo Texto: 'Já perdi por causa da cor'
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.