São Paulo, sexta-feira, 24 de março de 1995
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Philip Glass grava música em CD interativo

JAIR RATTNER
DE LISBOA

O músico minimalista norte-americano Philip Glass está gravando um CD interativo. Ele vai permitir ao usuário escolher para onde a música vai caminhar, acompanhada por imagens.
O trabalho está sendo feito junto com o designer Bob Israel e deve ficar pronto dentro de um ano: "Achamos que pode se tornar uma nova forma de arte", conta Glass.
O CD está sendo feito com equipamento IBM. "O pessoal da IBM levou um CD interativo a minha casa e me propôs brincar com ele para ver se tenho umas idéias novas", disse Glass, que se apresentou em Lisboa esta semana.
Ele já tinha trabalhado com Bob Israel em três óperas: "Satyagraha", "Orphée" e "The Voyage".
Para Glass, a possibilidade de o usuário intervir na música foi o grande desafio: "Comecei a criar uma peça com eventos paralelos. Eventos diferentes podem se movimentar dentro de uma linha de tempo", disse.
O CD inverte a lógica tradicional, em que a música é criada em função da imagem.
Em Lisboa, Glass resolveu problemas da ópera "Corvo Branco", que tem como tema os descobrimentos portugueses.
Encomendada pela Comissão Nacional para a Comemoração dos Descobrimentos Portugueses, a ópera deveria ter ficado pronta para a exposição Universal de Sevilha, em 1992. No entanto, só vai ser montada na Exposição Universal de Lisboa, em 98.
Glass só aceitou compor a ópera, baseada num libreto da portuguesa Luísa Costa Gomes, se a montagem fosse do americano Bob Wilson.
"Na época eu estava fazendo uma ópera sobre Colombo e disse que se pudéssemos convidar o Bob Wilson, isso ia garantir um trabalho muito diferente", afirmou.
A música da ópera já foi gravada, para permitir o trabalho de Wilson. No entanto, só depois de montada é que poderá ser feita uma edição em disco.
Atualmente, o Philip Glass Ensemble, composto por seis músicos, está trabalhando numa mistura de filme com ópera. Desde o ano passado, já foram mais de 40 apresentações de "La Belle et la Bête", baseado no filme de Jean Cocteau, de 1948.
"Tirei o diálogo do filme e escrevi uma partitura em que as vozes aparecem exatamente ao mesmo tempo que o movimento dos lábios no filme. Projetamos o filme e ao mesmo tempo representamos a ópera", explicou Glass.
Depois da "Belle et la Bête", que Glass chamou de Ópera para Ensemble e Filme, o próximo passo vai ser juntar o balé, o filme e a ópera. Será com o filme "Les Parents Terribles", também dirigido por Jean Cocteau. "Ele fez filmes clássicos, muito bonitos, com qualidade artística", disse Glass.
Para ele, os novos caminhos da música passam por essa união de artes diferentes. "A tecnologia que estou utilizando neste trabalho existe há apenas dois anos."
Uma mistura que não abre mão de elementos do passado. Glass quer recuperar, por exemplo, o melodrama, gênero em que o libreto não é cantado, como na ópera, mas recitado ao som de música. "É um gênero que não se usa já há uns 60 anos", diz o músico.
Ele observa também que diminui cada vez mais a barreira entre o popular e o erudito.
"Eu vi recentemente um concerto de jovens músicos em Nova York. Eles interpretaram uma peça minha com guitarra elétrica, marimba e corneta baixo. Muitas das minhas obras têm instrumentos da música pop, mas eu não faço alarde disso", afirma.
Desde 1988, Glass costuma passar todos os anos um mês no Rio. Ele aluga um apartamento, fecha-se e fica trabalhando.
"Em janeiro é muito frio em Nova York e, como não conheço muita gente no Brasil, posso trabalhar de 8 a 10 horas por dia sem ser atrapalhado. Se vou trabalhar, quero estar num lugar onde todo mundo está se divertindo", conta.

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