São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
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A reforma da Previdência e o seguro

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Com o recente envio pelo governo federal de sua proposta de reforma da Previdência Social para o Congresso, iniciou-se o processo responsável pela criação da maior fonte de financiamento de longo prazo já vista no Brasil.
Para se dar uma idéia dos números que poderão surgir, o BNDES, que hoje é praticamente a única fonte de recursos para investimentos produtivos à disposição dos empresários, dispõe de algo próximo a 1% do PIB para alavancar os seus projetos. Com a reforma da Previdência Social, apenas a previdência complementar poderá gerar, num curtíssimo espaço de tempo, valores da ordem de US$ 30 bilhões ou seja, algo próximo a 8,5% do PIB brasileiro, que serão, por força das regulamentações legais, destinados integralmente ao financiamento de projetos industriais e habitacionais de longo prazo, como acontece em todos os países desenvolvidos.
Este artigo não visa analisar o projeto enviado pelo Executivo ao Congresso Nacional, inclusive porque, pela magnitude dos números e interesses envolvidos, é certo que o projeto é apenas uma minuta, que sofrerá transformações profundas e depende essencialmente do poder de fogo do presidente Fernando Henrique para não sair completamente desvirtuado.
É sempre bom não se esquecer que o Congresso Nacional, ao longo de nossa história recente, teve o poder de frustrar todas as tentativas de colocar o país na rota do progresso, bloqueando-as com a maior sem-cerimônia, em nome de interesses menores que há décadas prejudicam o Brasil. A proposta do artigo é mostrar o que a reforma da Previdência pode significar para a atividade seguradora nacional e para a nação como um todo, já que seguradoras eficientes e capitalizadas são uma das ferramentas mais efetivas que existem para a distribuição de renda e geração de empregos.
Faz tempo que eu venho escrevendo nesta Folha que, assim que o Brasil saísse da crise, a atividade seguradora seria uma das que apresentariam maior índice de crescimento dentro da economia do país. Isto se confirmou ainda em 1994, quando o faturamento do setor cresceu algo próximo a 60% em relação ao seu desempenho em 1993. De menos de US$ 6 bilhões, há dois anos, o volume de prêmios no final do ano passado totalizou algo entre US$ 9 bilhões e US$ 10 bilhões. Provavelmente nenhuma outra atividade produtiva teve um desempenho desta ordem. E, se ninguém fizer besteira, o mercado deve continuar crescendo ao longo de 1995, atingindo a casa dos US$ 12 bilhões até o final do ano.
Com a reforma da Previdência Social e a consequente transferência de parte importante do sistema para a previdência complementar e para os planos de saúde privados, os números acima tornam-se insignificantes, possibilitando que a atividade seja pensada na casa dos US$ 20 bilhões por ano em muito pouco tempo. E esta massa de dinheiro será canalizada para o financiamento do desenvolvimento do país, tanto através das Bolsas de Valores como por meio de investimentos diretos, como as antigas carteiras hipotecárias. Nos anos 50, essas carteiras foram as responsáveis pelo financiamento da casa própria, através de apólices de seguro de vida que garantiam a amortização do imóvel em caso de morte do proprietário, que pagava um prêmio mensal correspondente ao valor da prestação para a seguradora —o agente financeiro de longo prazo encarregado deste tipo de operação.
Qual será o patamar da previdência pública é indiferente. A transferência de recursos para a previdência complementar, que tem a obrigação de basear os seus custos em cálculos atuariais capazes de garantir os capitais contratados pelos seus segurados e de constituir as reservas técnicas necessárias para fazer frente a estas obrigações, projetando-as para um desembolso futuro após, em média, 15 anos, é mais do que suficiente para gerar ativos muitas vezes superiores aos totais anuais à disposição do BNDES.
Tão importante quanto a massa de recursos injetada pela criação da previdência complementar no setor de seguros é a definição de regras para o funcionamento eficiente dos planos de saúde privados. Hoje, com todas as restrições que lhes são feitas, os planos privados atendem 35 milhões de brasileiros. Mais do que atendê-los, estes planos possibilitaram que uma parte significativa da população, condenada até há poucos anos a morrer nas filas da rede pública, passasse a ter acesso a uma medicina de Primeiro Mundo, representada pelos melhores médicos e pelos hospitais e laboratórios mais modernos do país, que fazem parte de suas redes credenciadas, colocados à disposição dos segurados rapidamente sempre que necessário.
As diferenças entre as entradas e saídas de dinheiro da previdência complementar e dos planos de saúde privados são gigantescas e impossibilitam que o seu gerenciamento seja feito através de um único caixa. Assim, é indispensável que as regras para cada uma das atividades sejam definidas com precisão e a Superintendência de Seguros Privados equipada com os meios para fiscalizar com rigor as respectivas operações.
O próprio órgão vem desenvolvendo estudos da maior seriedade nesse sentido, bem como no sentido de adequar o mercado para este futuro que se apresenta inexoravelmente próximo. Projetos como a quebra do monopólio do resseguro do Instituto de Resseguros do Brasil, a implantação de controles das margens de solvência das seguradoras e a abertura do mercado segurador brasileiro para as companhias estrangeiras não podem ser interrompidos e precisam estar perfeitamente definidos antes que o Congresso Nacional aprove as mudanças que criarão poupanças compulsórias destinadas a injetar algo próximo de US$ 30 bilhões para financiar as atividades produtivas do país.

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