São Paulo, segunda-feira, 27 de março de 1995
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Oscar-95 põe em questão poder da imagem

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Oscar-95 põe imagem em questão
É um ano muito estranho. Quando o SBT começar a transmitir para o Brasil a 67ª cerimônia de entrega do Oscar, às 22h, o espectador já saberá que o prêmio de melhor filme tem muitas chances de ir para "Forrest Gump", "Quiz Show" ou "Tempo de Violência". Mas nenhum mobiliza paixões ou levanta polêmicas sobre tendências ou possíveis injustiças.
Os três têm como ponto comum colocar —de modo mais ou menos explícito— a discussão sobre o que significa a imagem neste final de século. Cada um à sua maneira desafia o lugar-comum segundo o qual é necessário apenas ver para crer.
O favorito "Forrest Gump" é um vasto painel da história americana contemporânea. Abandona as certezas dos anos 30 e 40, as angústias dos anos 50, as incertezas pós-Guerra do Vietnã, as tentativas de reencontrar a antiga força através da tradição.
Em troca, propõe ao espectador um vasto painel em que a história, vista pelos olhos de um homem ingênuo, abre-se à plena ambiguidade. É irônica e dramática, ridícula e trágica.
Mas é, sobretudo, tecnológica: mostra o quanto o mundo das imagens avançou em matéria de falsificação, a ponto de tornar indistinguível o falso e o verdadeiro (sabemos, por exemplo, que o personagem não encontrou os presidentes com que cruza no filme, mas não sabemos o quanto somos enganados por trucagens semelhantes).
"Quiz Show" talvez seja menos impressionante, mas seu significado não é menos amplo. O filme narra um episódio de desmascaramento de um programa de TV de perguntas e respostas célebre nos anos 50. Mas esse episódio toca em um aspecto delicado do mundo contemporâneo, que é a crença quase absoluta inspirada pela TV. De passagem, pela própria natureza do programa, o filme enfoca o conflito entre crença e razão numa sociedade ultradesenvolvida.
Em outro compasso, mas na mesma linha, "Tempo de Violência" funda-se sobre um roteiro de construção engenhosa, em que início e fim se confundem. Essa construção surpreende e desmonta o sistema de crenças do espectador acostumado à narrativa tradicional. É como se o filme o aconselhasse a não se entregar, nunca, àquilo que vê.
Nos dois filmes restantes, "Um Sonho de Liberdade" e "Quatro Casamentos e um Funeral", a direção é outra. Estamos diante de filmes tradicionais. O primeiro é um drama penitenciário sem surpresas, puxado por um elenco sólido.
"Quatro Casamentos" é uma comédia inglesa que recoloca a hora do casamento como ponto máximo da vida afetiva. O que mais conta, neste caso, é o efeito Aids: a mística do grande amor reencontra a monogamia e conecta o cinema dos anos 90 ao dos anos 30. Mas Oscar que é Oscar dificilmente pode dispensar um toque regressivo.
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sobre o Oscar às págs. 5-3, 5-4, 5-5 e 5-6

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