São Paulo, sábado, 1 de abril de 1995
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"Chegou a hora da Amazônia", diz FHC

Durante encontro com governadores da região amazônica, presidente fala em "compromisso de trabalho"
Discurso do presidente Fernando Henrique Cardoso na abertura do encontro com governadores da Amazônia, no Pará:
Senhor Governador do Pará, Dr. Almir Gabriel,
E saudando o Governador do Pará, eu saúdo os Governadores aqui presentes, saúdo a todos os Governadores da Amazônia, o que muito me agrada e me orgulha, como brasileiro, de tê-los todos aqui para discutirmos questões de interesse da Amazônia.
Senhores Senadores,
Senhores Deputados,
Senhores Ministros,
Senhores Prefeitos,
Senhoras,
Senhores,
Senhores Generais,
Eu serei muito breve na abertura desse nosso encontro. Nós teremos nos próximos dias, de hoje até domingo, muitas oportunidades para estarmos juntos para conversarmos.
Mas eu queria apenas expressar, além da minha satisfação de poder estar aqui, hoje, no Pará, e daqui a pouco, mais tarde, em Manaus, dizer também que o caráter desse encontro é um caráter de uma reunião de trabalho.
Nós não temos ainda, aliás, estamos completando três meses de governo. E desde o momento em que, ao me comprometer com o povo do meu país, (...) me dedicar com afinco à administração brasileira, eu não deixei nunca de pensar na Amazônia.
Desde a campanha, quando aqui estive, e poucas vezes, desde que vi os resultados eleitorais, que foram os mais elevados que tive no Brasil em termos proporcionais, o que mostra a generosidade desse povo, eu sempre pensei com os meus botões que era além de obrigação normal de um presidente, além do sentimento corrente num cidadão brasileiro, no meu caso havia mais do que isso: havia também um sentimento de ligação muito forte com a Amazônia.
Minha mãe é amazonense, nasceu em Manaus. Eu, desde pequeno, fui educado ouvindo histórias da Amazônia, embora eu não conhecesse a Amazônia quando menino. Anos mais tarde, andei aqui pelo sul do Pará. Escrevi um livro sobre a colonização no Sul do Pará e o caráter do Estado brasileiro. Portanto, a Amazônia não é para mim alguma coisa desconhecida, nem se trata de objeto de estudo, nem simplesmente de um rincão lá longe, importante, que o mundo todo fala, é mui to mais do que isso: é gente, é povo, é sentimento que corre no sangue e que se sente na pele.
E acredite que, com toda essa motivação, a melhor maneira que eu possa ter de devolver à Amazônia o muito que a ela devo, de formação, de berço e de eleição, de votação, de amizade. Tantos são os governadores, os parlamentares, os administradores daqui com os quais eu tenho uma relação muito próxima. A melhor maneira de servir a tudo isso seria trabalhando. Nós podíamos fazer vários tipos de visita, mas eu acho que uma visita que realmente corresponde ao interesse da Amazônia não é uma visita, é um compromisso de trabalho. Então, o caráter dessa reunião é de uma reunião de trabalho.
Nós não estamos aqui para comemorar nada. Nós não estamos aqui para trocar elogios. Nós estamos aqui para ouvi-los. Para ouvi-los e para definirmos, em conjunto, o nosso programa de ação para os próximos quatro anos.
Eu, quando candidato, eu apresentei algumas idéias sobre a Amazônia que recolhi da própria Amazônia. Agora, é preciso dar corpo às idéias, é preciso compatibilizar os recursos com o que se deveria fazer, é preciso hierarquizar, dar prioridades, e não assumir compromissos que não possam ser cumpridos, nem imaginar que de Brasília nós possamos realmente saber o que a Amazônia precisa. É aqui, é conversando, é discutindo, é revendo posições.
Tenho dito isso desde que assumi o governo, que é preciso ter a humildade e a coragem para rever posições. E se a proposta for errada, corrige-se. O que não se pode é, por presunção, por insolência, recusar-se o diálogo. Estamos aqui para dialogar democraticamente. Cada qual de nós com as nossas responsabilidades próprias. Mas, quando nós terminarmos esse encontro de três dias, os projetos que nós dissermos que faremos nós vamos ter que fazer. E somos nós quem vamos fazer, não é o presidente, é o conjunto. Nós vamos fazê-los.
Não estou dizendo isso para não me comprometer desde hoje com alguma coisa, desde esta viagem, não. Aliás, os ministros se reuniram entre si, já se reuniram com os secretários. O ministro do Meio Ambiente e o ministro da Integração Regional fizeram, ambos, encontros; o ministro do Planejamento participou, dos Transportes, Indústria e Comércio, enfim, Minas e Energia, Ciência e Tecnologia. Os governadores conversaram, eu me reuni ainda esta semana com os ministros e alguns técnicos para que nós tenhamos uma certa idéia. Nós temos alguma idéia de por onde é possível começar, mas vamos sacramentá-las agora, aqui nesse encontro.
E eu quero parabenizar o governador Almir Gabriel por ter decidido que o encontro seria aqui, em Carajás, porque nos propicia a oportunidade de ver essa magnífica Companhia do Vale do Rio Doce, o que ela está fazendo para o desenvolvimento do Brasil, com o respeito à preservação ambiental, com preocupação social, como uma companhia que é responsável perante a cidadania deve atuar. Ele vai e nos oferece esse ambiente, que é um ambiente que permite a reflexão, que permite o trabalho.
Eu vou pedir que cada um dos governadores, nessa sessão inaugural de nossos dias de trabalho, que cada um depois faça as suas observações e diga, segundo sua visão, quais são os problemas, quais são as prioridades, embora nós, talvez, tenhamos a ilusão de já saber, é sempre melhor saber de viva voz. Eu quero dizer-lhes também que a nossa preocupação, compartilhada pelo Ministério todo, não é simplesmente de fazer uma obra aqui, outra obra ali, é de criar realmente eixos de desenvolvimento, que tenham repercussão, que estruturem. Eu tenho conversado com o ministro Cícero Lucena sobre essa matéria, com o ministro Gustavo Krause, é preciso que haja ações que permitam a estruturação, a integração.
E também quero deixar mais uma vez claro que, no meu modo de entender, não se trata de tomar uma região como a Amazônia, de significado tão grande para todos nós e de significado internacional, e dizer: "bom, então, isso é um problema da Amazônia. Fizemos isso, agora, a Amazônia que ande com os seus próprios meios. Ou o Nordeste, ou o Sul". Não é isso não.
Hoje, para que nós possamos bem entender um problema que é aparentemente regional, nós temos que percebê-lo nacionalmente. É o Brasil que quer assim, no seu conjunto. Não é por causa da Amazônia, de Tocantins ou do Mato Grosso isoladamente, é uma integração. E integração não se faz colocando num canto o Ministério da Amazônia, o Ministério do Nordeste -podem existir, como existem alguns-, mas a preocupação é do governo da Nação. Sou eu que quero, em nome do povo brasileiro, a integração nacional.
Nós brasileiros, todos os ministros, sejam da Amazônia ou não seja, ele tem que saber que uma porção importante da ação do governo, no seu conjunto, é uma ação que tem de ser integradora, de tal maneira que nós possamos de verdade, não só de palavras, diminuir as desigualdades regionais. E, também, eu fiquei muito contente com os contatos que tive com os governos hoje da Amazônia, que procuraram, eles próprios mais de uma vez, organizadamente, para chamar a minha atenção para o fato que hoje temos aqui governadores que tenham a concepção adequada do que é o desenvolvimento na Amazônia; que o desenvolvimento é auto-sustentável, não é uma palavra, não é um conceito, é uma realidade que tem que ser uma realidade e que esta realidade do auto-sustentável implica na preservação da natureza e do homem e da mulher, do ser humano também. É desenvolvimento social também, é crescimento econômico também, dentro de um contexto, como aqui é um belo exemplo em Carajás, em que se pode coadunar tanto a inspiração racional da natureza, preservando-a da devastação, como a necessidade de dar emprego, como a necessidade de dar saúde e dar terra, provavelmente, por aqui, haverá hoje gente pedindo terra, é justo, o governo não pode fazer tudo num primeiro momento, mas esse governo vai dar terra a quem precisa de terra. Nós desapropriamos já nesses três meses 1 milhão de hectares de terra, nunca ninguém fez isso, de uma só (...) para poder assentar 40 mil famílias.
O Brasil pode fazer isso, dentro de uma concepção democrática, respeitamos os direitos, mas trabalhando. Essa é a nossa disposição, de trabalhar e com ela, a disposição de trabalho (...). Eu vou pedir que os governadores trabalhem um pouquinho por mim, que eu vou descansar um pouco.

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