São Paulo, quinta-feira, 6 de abril de 1995
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Preso brasileiro faz 'teste da verdade' na TV

JAIR RATTNER
DE LISBOA

O padre brasileiro Frederico Marques da Cunha foi o primeiro participante do programa "Máquina da Verdade", da TV portuguesa. O programa foi alvo de críticas até no parlamento português.
Ligado a um detector de mentiras, o padre respondeu que era inocente de uma acusação de assassinato. Condenado no ano passado a 12 anos de prisão pela morte de Luís Miguel Escórcio Correia, o padre foi autorizado a deixar a cadeia para participar do programa, transmitido na quinta-feira passada.
"Assim que o programa foi anunciado, a emissora começou a receber pressões para não transmiti-lo", disse o apresentador Carlos Narciso. Segundo ele, isso só serviu para ajudar o programa, que teve 70% de ibope: "Batemos todos os recordes."
O ponto alto da "Máquina da Verdade" foi o momento em que o padre Frederico foi ligado ao detector de mentiras. Trata-se de uma máquina com cinco sensores, dois colocados em volta do tórax -um para medir a respiração diafragmática e outro para a respiração toráxica- e três nos dedos da mão: dois para verificar alterações químicas na pele, como o aumento do suor, e o terceiro para medir os batimentos cardíacos.
A máquina faz um gráfico para cada uma das funções medidas, registrando cada alteração. Atualmente, o detector de mentiras é usado pelas polícias dos Estados Unidos, Japão, México, Israel e pela Scotland Yard, da Inglaterra.
Ligado à máquina, o padre respondeu 12 perguntas. Seus batimentos cardíacos serviram de "trilha sonora" do programa. Duas vezes ocorreram sinais de alterações emocionais. Quando o apresentador perguntou se o padre tinha amigos homossexuais e quando o padre admitiu que tinha estado no local do crime.
Mas quando o apresentador perguntou se o padre teve relações sexuais com Luís Miguel Escórcio ou se o tinha agredido ou empurrado, os sensores não se mexeram, o que foi considerado como uma confirmação da sua versão.
Antes de ligar o padre ao detector, Narciso entrevistou três testemunhas favoráveis ao padre. Duas disseram que o viram no local do crime acompanhado por seu afilhado e não por Luís Miguel. A terceira era um médico legista que fez uma autópsia contrariando a tese da acusação, mas não foi chamado para depor no processo.
No dia seguinte, o programa foi o tema das discussões do parlamento. Membros de todos os partidos condenaram a apresentação.
O deputado Narana Coissoró foi o mais radical, afirmando que era um atentado à soberania portuguesa. "Isto põe em causa o que há de mais sagrado no estado de direito", disse em seu discurso.
O corpo de Luís Miguel Escórcio Correia, de 15 anos, apareceu jogado num precipício à beira mar na Ilha da Madeira, no dia 2 de maio de 1992. No dia 25 de maio, a polícia recebeu um telefonema anônimo que informava que o carro de Frederico Cunha tinha sido visto no mirante no dia do crime.
O julgamento do padre só terminou em 1994. Ele foi condenado a 12 anos de prisão pelo assassinato, mais 18 meses por ter relações homossexuais com um menor e, depois de cumprir a pena, a ser expulso de Portugal.

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