São Paulo, sexta-feira, 7 de abril de 1995
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A caminho da Idade da Pedra

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Sintomática a primeira baixa na equipe presidencial. O homem das comunicações foi acusado de não maquiar adequadamente a imagem do governo em geral e a do presidente em particular.
Tudo começou com a gafe da recepção no Planalto. Deixaram o dr. Roberto Marinho em pé, numa sala com 3.000 anônimos. Não lhe serviram sequer um copo de Coca-Cola. O descuido custou caro, FHC teve de lhe oferecer um jantar. O que custaria menos de R$ 1 acabou saindo por uns R$ 200 (o jantar foi a quatro). Um rombo de 200% no erário nacional, logo nos primeiros dias da era tucana.
Onde falhou o homem das comunicações? Negar ou desmentir a gafe teria sido pior. Bem, foi um pecado desculpável pelo assanhamento da festa. Coisa pior viria pela frente.
No início de março, refestelado no jardim da casa chilena que o hospedava, FHC anunciou as tais bandas que dariam um prejuízo maior do que o jantar do dr. Marinho. A última cifra, divulgada esta semana, fala em mais de US$ 4 bilhões. A culpa foi do secretário que deveria zelar pela imagem do presidente "a posteriori", depois do ventilador posto a funcionar.
Além do prejuízo em dólares, o governo recebeu um petardo na própria credibilidade e botou na boca das matildes a honorabilidade de sua equipe econômica. Mais uma vez, a culpa foi do secretário que não andou de redação em redação, de joelhos e mãos postas, explicando o inexplicável.
Na Antiguidade era praxe mandar cortar a língua dos mensageiros que traziam más notícias. Já era um avanço, pois antes disso cortava-se a língua dos que, embora não trazendo notícias más, tampouco as traziam boas. A obrigação desses profissionais da comunicação, ancestrais dos técnicos que hoje conhecemos, era ornamentar o príncipe ou o soba com a imagem da divindade. Não havia "Diário Oficial" na época: a fritura era cortar a língua.
Como se vê, a modernidade dos tucanos consegue diariamente a façanha de progredir para trás. Mais alguns meses e estaremos de volta à Idade da Pedra, com os mais aptos se nutrindo com as proteínas dos menos aptos -ao som dos tambores que farão a comunicação na aldeia global.

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