São Paulo, sábado, 8 de abril de 1995
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O paradoxo que nos leva ao México

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Sem melhora do quadro financeiro externo, será difícil defender a atual banda cambial

O governo terminou a semana "negra" iniciada em 6 de março comprometido formalmente com uma banda cambial estreita por prazo indeterminado. As autoridades econômicas sentiram-se obrigadas a esclarecer diversas vezes que a nova banda será mantida por "muito tempo". Para fazer face à perda de credibilidade da âncora cambial, o governo também promoveu um choque de juros e um aumento drástico das alíquotas sobre certas importações.
Vejam o paradoxo. A operação lançada pelo governo tinha como propósito básico "flexibilizar" a política cambial e afastar o risco de um colapso "à la" México. Lamentavelmente, a confusão que se criou foi de tal ordem que o governo acabou enrijecendo a âncora cambial e se aproximando, em alguns pontos, ainda mais do modelo que levou o México ao desastre!
A banda informal que vigorava até março constituía uma forma mais flexível de política cambial. Ao explicitar o compromisso com uma banda estreita, o governo reforçou a sua dependência em relação a um tipo de ancoragem que não comanda mais credibilidade.
Afinal, o que conduziu o México ao colapso foi justamente a tentativa de sustentar por um longo período uma taxa de câmbio irrealista com base em bandas estreitas protegidas por juros internos altos e vendas de títulos indexados ao dólar. Qualquer semelhança não é mera coincidência, dado que a manutenção de juros elevados e a colocação de títulos cambiais são expedientes costumeiramente utilizados para tentar defender taxas de câmbio irrealistas.
Não é difícil perceber que essa combinação de políticas tem fôlego curto. Dada a existência de uma significativa dívida interna pública de curto prazo, a sustentação de juros elevados por muito tempo poderá comprometer a já frágil base fiscal do Plano Real.
Além disso, a desvalorização nominal de cerca de 7% que o governo promoveu ao implantar a nova banda cambial não altera de forma duradoura a posição do câmbio real. Supondo uma inflação da ordem de 2% a 2,5% ao mês, em questão de apenas três a quatro meses a taxa de câmbio real com o dólar estará de volta ao nível de fevereiro.
A menos que ocorra uma melhora do quadro financeiro externo, será difícil defender a atual banda cambial por muito tempo. Quem tiver dúvidas sobre isso deve refletir um pouco sobre o quadro de balanço de pagamentos. O déficit em conta corrente exclusive balança comercial deve ficar em torno de US$ 15 bilhões este ano, em grande medida por causa do peso dos juros da dívida externa. A meta do governo é alcançar um superávit de US$ 5 bilhões na balança comercial, o que levaria o déficit em conta corrente para algo como US$ 10 bilhões em 1995.
Ao longo deste ano, vencem amortizações da dívida externa da ordem de US$ 11 bilhões, que se somam ao déficit corrente previsto para compor uma necessidade bruta de financiamento externo da ordem de US$ 21 bilhões. Esse é o montante de capitais externos que precisaria ingressar no país para que fosse possível cobrir o déficit corrente e refinanciar o principal da dívida sem perda de reservas.
Como assegurar uma entrada dessa ordem no quadro internacional que se criou após o colapso do peso mexicano? Será inevitável alguma perda de reservas, e o governo faria melhor se tivesse em vista uma recuperação mais acentuada da balança comercial, trazendo o superávit para US$ 8 bilhões a US$ 10 bilhões. Dificilmente esse objetivo será alcançado se o governo não estiver disposto a flexibilizar a política cambial e promover nova desvalorização, combinando-a com a desaceleração da demanda e uma política mais ativa de comércio exterior.

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