São Paulo, terça-feira, 11 de abril de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Amazônia -a utopia concreta

GUSTAVO KRAUSE

Compromisso é dívida. Principalmente se esse compromisso resulta da relação entre o eleito e o eleitor, sagrada pela vontade expressa na escolha democrática. Isto mesmo, uma dívida sagrada porque do lado do povo, votar, como ele votou na última eleição presidencial, é sempre uma renovação de esperanças e de confiança no futuro. Do lado do governante, porque pesa sobre ele como um fardo de formidável responsabilidade.
O presidente sabe disso. E os amazônidas lhe deram uma vitória extraordinária, sem que as praças públicas da região tivessem recebido o então candidato com a mesma frequência de outras regiões do país. O eleitor votou num projeto, num caminho, que o presidente simboliza e, hoje, detentor do poder, passa a construí-lo efetivamente.
O presidente e expressiva parcela da equipe foram à Amazônia para começar a resgatar as dívidas. Dívidas tão grandes quanto antigas. Sem enganação.
Exercendo "a paixão pelo possível" para tornar viável, naquela região, o que chamo de a utopia concreta do final do século. Essa utopia significa superar falsos dilemas e enfrentar velhas contradições para incorporar as dimensões econômicas, sociais e ambientais na realização da contemporânea e desafiante idéia do desenvolvimento sustentável.
Mais não foi só isso. O presidente demonstrou com clareza que está praticando um novo estilo de governar e uma forma diferente de encarar o desafio amazônico.
O que desembarcou em Carajás não foi o poder providencial do governo central. O poder que pode tudo, inclusive o de prometer e não cumprir.
Quem desembarcou em Carajás foi o governante de um país amadurecido, ao lado de governadores, prefeitos, e parlamentares, para a celebração de um pacto político, corporificado pela Carta da Amazônia, onde está expresso, entre outros postulados:
"As notáveis potencialidades da Amazônia representam, de um lado, um fator estratégico a ser mobilizado em favor de um projeto nacional de desenvolvimento, social e rigorosamente equilibrado. E, de outra, oferece um singular espaço para resposta ao desafio contemporâneo de explorar o extraordinário capital natural disponível de forma sustentável.
"Os governadores da Amazônia pensam que não é mais possível conceber-se um modelo de ocupação que sacrifique a fauna e a flora da região e que deixe de promover o desenvolvimento pleno das populações locais. Nada justifica o preço da destruição da nossa diversidade biológica, patrimônio nacional de incalculável valor científico, cultural, econômico e social."
Ao celebrar um pacto com o presidente da República, as forças políticas da região superpõem uma visão estratégica -que une- a uma ação fragmentada que perpetua um deplorável estado de pobreza.
De outra parte, constroem, independente de vinculação partidária e convicção ideológica, laços de cooperação e solidariedade política como a forma capaz de reverter a ação dos governos em benefício de uma vida digna para o homem da Amazônia.
Compartilhando responsabilidades e juntando esforços, como um estilo de exercer o governo, o presidente da República esboçou uma agenda cuja leitura confirma a necessidade de integrar políticas públicas e buscar na sociedade, e, em especial, nas organizações não-governamentais, a indispensável parceria para a eficácia e exemplaridade nas ações concretas.
Foi assim com a inauguração do "Bosque da Ciência", para reafirmar a pesquisa científica e os centros de excelência como ferramentas para conhecer e utilizar adequadamente a exuberante biodiversidade tropical; foi assim ao transferir os primeiros recursos destinados pelo Grupo do PPG-7, em cooperação internacional, para as comunidades extrativistas e indígenas, na presença de representantes dos países.
Com o gesto, o governo superou as longas e penosas fases das negociações e, ao mesmo tempo, mandou um recado aos patrocinadores de que será ágil na captação e uso dos recursos internacionais. Paralelamente, reconheceu a Zona Franca como um pólo dinâmico e anunciou, a exemplo do que já ocorre no Nordeste, uma ação cooperada para desenvolver as notáveis potencialidades do ecoturismo na região.
Toda a perspectiva estratégica de médio e longo prazos será debatida em foros específicos com as forças representativas da região, de modo a compor o plano plurianual de investimentos a ser enviado ao Congresso, em agosto.
Todavia, o presidente não deixou escapar a ocasião para anunciar a realização de obras de infra-estrutura importantes para a região, com o cuidado de respeitar as estreitas margens das disponibilidades financeiras. Uma atitude séria para não frustrar as expectativas, e que foi tomada depois de consultar os responsáveis pelas áreas.
Foi assim que o presidente anunciou a construção da BR-174, a hidrovia Araguaia-Tocantins, a ampliação da refinaria de Manaus e, muito em breve, a utilização energética das reservas de gás do Juruá e de Urucu.
Não é, pois, difícil enxergar o estilo de o presidente governar: sólidas convicções democráticas, coerência e consistência programática e responsabilidades políticas compartilhadas.

Texto Anterior: VIA LATINO-AMERICANA; FOME E REVOLTA; EXTERMINADOR DO PASSADO
Próximo Texto: Anistia não é perdão
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.