São Paulo, quinta-feira, 13 de abril de 1995
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Rap do Planet Hemp traz Rio acima de 40 graus

MARCEL PLASSE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Acredite no "hype". "Usuário", o álbum que marca a estréia do grupo carioca Planet Hemp e da série Super Demo (divisão do selo Chaos, da Sony), é excelente, a ponto de subir a temperatura do Rio que seu rap retrata.
Suas letras sobre maconha e violência urbana do Rio são tão fortes quanto o "hype" (promoção) da imprensa (que soltou reportagens elogiosas, antes de o CD sair) e da gravadora Sony, que distribuiu como peça promocional uma latinha ilustrada com referências à erva ("hemp" é um nome usado em inglês para maconha) -já um item de colecionador.
O discurso da liberação da maconha impregna forte o disco. Até então, a droga tinha sido abordada de maneira dissimulada no pop nacional -desde os Golden Boys.
Planet Hemp escancara. "Legalize Já" é um hino de campanha, nos moldes de "Legalize It", de Peter Tosh (que aparece "sampleado" no fim da música).
Marcelo D2 (vocal) resume a posição da banda: "A gente não é pró-maconha; é contra o tráfico."
A solução para a violência do Rio, segundo a banda, é a legalização da droga. "Não adianta subir o morro e dar porrada", diz D2. "Já está comprovado. Só o que o governo está conseguindo, com a ação do Exército, é criar um clima de guerra civil."
A violência policial, a miséria, o racismo, as chacinas de meninos e a falência do país inspiram várias letras de "Usuário". Planet Hemp não é apenas uma banda de "chapados" inconsequentes. A consciência social cai bem no rap, estilo adotado pelos vocalistas D2 e B Negão, capaz de cuspir inúmeras denúncias por segundo.
O rap e o metal não são as únicas escolas catalogadas. O reggae e o dancehall combinam-se com "scratches" (técnica de discotecagem do hip hop), pagode de morro, blues, psicodelia, funk, soul, hardcore e rock industrial.
As referências do disco, algumas até sampleadas, incluem Public Enemy, NWA, U-Roy, Shabba Ranks, Ministry, DeFalla, Jorge Benjor, Beastie Boys, Jimi Hendrix e Cypress Hill.
"Usuário" ainda traz o refrão "burn, baby burn", dos distúrbios raciais dos anos 60, nos EUA, e a expressão "diamba", que, segundo a banda, significa maconha para alguns índios brasileiros.
Ao mesmo tempo, ele tem uma aura muito carioca. Das fotos da capa e do encarte -uma sinuca da Lapa, região onde a banda se formou- às participações especiais, que incluem de Black Future ao pessoal do rap.
O Rio do Planet Hemp é muito diferente do frequentado pelo Barão Vermelho ou por Kid Abelha. É um "Rio Zona Norte", onde rola o funk, o pagode e os tiroteios.
Há dois anos, os integrantes da banda rodavam, durangos, no circuito que poderia ser realmente chamado de Super Demo -D2 chegou a morar, por três meses, no Garage Art Cult, lar da cena "underground" carioca.
O CD, dedicado ao ex-vocalista Skunk, que morreu de Aids antes de a banda sair do Garage, bate com a lenda: instrumentais improvisados e sonoridade tosca.
Mas os "Raimundos" da Sony saem com a ambiciosa tiragem inicial de 20 mil discos. "Seria o máximo vender como Raimundos", sonha D2. "Não só para nós, mas para toda a cena do rock novo."

Disco: Usuário
Banda: Planet Hemp
Gravadora: BMG
Preço: R$ 20 (o CD, em média)

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