São Paulo, sábado, 15 de abril de 1995
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Curativo mofado ajuda feridas a sarar

ANDY COGHLAN
DA "NEW SCIENTIST"

É possível que as soluções da medicina popular para curar feridas, cobrindo-as com pão embolorado ou fungos, tenham fundamento científico.
Cientistas acabam de demonstrar que certos fungos têm propriedades que ajudam a curar feridas.
Paul Hamlyn e seus colegas, do Grupo de Tecnologia Têxtil Britânico, em Manchester (Reino Unido), esperam desenvolver curativos cirúrgicos tratados com fungos que aceleram a cura de feridas, além de protegê-las contra infecções.
Embora ainda não tenham sido realizados testes com feridas de verdade, experiências feitas com células de pele humana em cultura deram resultados encorajadores.
Em vez de produzir antibióticos, como os mofos de penicilina, os fungos usados são eficientes devido à quitina -principal componente estrutural da parede de células de fungos- e a um composto irmão chamado quitosan.
Hamlyn diz que esses curativos podem até mesmo reduzir a necessidade de se usar antibióticos.
O uso excessivo de antibióticos constitui um grande problema para os hospitais, porque as bactérias podem adquirir resistência a eles.
Hamlyn, trabalhando em cooperação com Richard Schmidt, da Escola de Farmácia da Universidade do País de Gales, em Cardiff (Reino Unido), expôs fibroblastos -células que formam tecidos fibrosos do corpo, como tendões, por exemplo- humanas a seis linhagens de fungos.
Os fibroblastos desempenham importante papel na cura de feridas, deitando as fundações para a formação do tecido cicatrizado.
Os pesquisadores usaram micélios -filamentos produzidos pelos fungos- e descobriram que os micélios mais ricos em quitina e quitosan foram os que desencadearam o crescimento mais rápido dos fibroblastos.
Os micélios também pareciam funcionar como andaimes, atraindo fibroblastos e ancorando-os, para a etapa seguinte de cicatrização, quando se forma o tecido de cicatrização, chamado colágeno.
O mofo que apresentou melhores resultados foi o Phycomyces blakesleeanus, um mofo comum que é encontrado em pão velho, nas fezes humanas, em madeira morta e em esterco de cavalo.
Foi o mofo que desencadeou o mais rápido crescimento de células fibroblasto, com 17% mais células formadas após seis dias numa cultura de controle.
À medida que o quitosan se oxida, gera uma substância também presente na água oxigenada, o peróxido de hidrogênio. Schmidt acredita que seja esse o segredo do sucesso dos mofos.
Embora o peróxido de hidrogênio seja tóxico em grandes quantidades, ele é essencial para o processo de cura de feridas.
O composto ativa as células sanguíneas brancas, que combatem a infecção em feridas. "E também desencadeia a proliferação de fibroblastos", diz Schmidt.
Hamlyn patenteou processos de cultivo de micélios em biorreatores, limpando-os e transformando-os em curativos cirúrgicos.
Hele produziu tecidos absorventes, para as feridas superficiais, e gaze absorvente, para feridas mais profundas.
Ele diz que é possível fortalecer o material misturando os micélios com fibras de madeira.
O Grupo de Tecnologia Têxtil Britânico, com sede em Londres, espera comercializar as patentes dos pesquisadores e está procurando sócios industriais para desenvolver os curativos.
Hamlyn afirma que, pelo fato de os fungos serem farmacologicamente ativos, os curativos terão que passar por testes clínicos integrais no futuro.
Ele prevê que eles serão úteis principalmente para tratar feridas persistentes.

Tradução de Clara Allain

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