São Paulo, segunda-feira, 17 de abril de 1995
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FHC enfrenta novo atrito na visita aos EUA

GILBERTO DIMENSTEIN
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

O aumento das alíquotas do II (Imposto de Importação) criou uma nova área de tensão entre o Brasil e os Estados Unidos, onde o presidente Fernando Henrique Cardoso inicia hoje visita de cinco dias, começando por Nova York.
Diplomatas brasileiros em Washington receiam que esta discussão crie um ponto de atrito durante a viagem.
O governo norte-americano está emitindo sinais de que o aumento das alíquotas não foi bem-visto, pois arranha a política de redução das tarifas e afeta as exportações dos EUA.
O ministro Pedro Malan (Fazenda) captou essa preocupação e enfatiza que a elevação das tarifas de importação é episódica e emergencial, uma medida para preservar as reservas brasileiras. A mensagem vai ser reforçada pelo presidente.
O aumento do II é, até agora, o principal risco de controvérsia entre os dois países. O clima, porém, é positivo.
Os Estados Unidos exibem uma recepção destinada a credenciar Fernando Henrique Cardoso como um interlocutor privilegiado na América Latina.
O encontro é apresentado como uma visita de Estado, categoria diplomática mais alta concedida a governantes estrangeiros.
Os EUA têm por ano duas visitas de Estado. As demais são classificadas como visitas de negócios ou cortesia.
Os sinais de prestígio são consequência da aposta do governo norte-americano na importância do Brasil para a integração comercial do hemisfério, onde os Estados Unidos querem assegurar sua área de influência.
Leva-se em conta não apenas o tamanho do Brasil e sua população, mas também a produção de riqueza (PIB), superior a qualquer nação latino-americana. O que se traduz num importante mercado para produtos norte-americanos.
Os textos preparatórios da viagem produzidos pelo Departamento de Estado (Ministério das Relações Exteriores dos EUA) apontam Fernando Henrique como um aliado "confiável", preocupado em reforçar os laços com os EUA.
Essa visão é reforçada pelas amizades de Fernando Henrique nos meios intelectuais norte-americanos próximos ao Partido Democrata, de Bill Clinton, e mesmo dentro do governo.
Também é reforçado que, enquanto ministro da Fazenda, ele se bateu pela privatização, estímulo ao capital estrangeiro e diminuição do tamanho do Estado (idéias que se convencionaram chamar de Consenso de Washington).
A visão que se retira dos textos do Departamento de Estado coincidem com a análise do Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
"Há muito tempo não tínhamos uma fase tão boa com os Estados Unidos", disse à Folha o chanceler Luiz Felipe Lampreia.
Reduziram de tamanho conflitos em torno da energia nuclear, direitos humanos, moratória da dívida externa, informática, protecionismo comercial e mesmo patentes.
Para reduzir ainda mais eventuais áreas de atritos, assinou-se na semana passada, em Brasília, um acordo entre Estados Unidos e Brasil para combate ao narcotráfico -o assunto, desprezado no Brasil, está no topo das preocupações dos norte-americanos.
Relatórios do Departamento de Estado apontam o Brasil cada vez mais envolvido no narcotráfico e desconfiam do empenho das autoridades brasileiras. Montou-se também um convênio de colaboração na área nuclear.
O governo tentou -e não conseguiu- avançar a tramitação no Senado da Lei de Patentes (pagamento pelo uso de invenções).
FHC traz pelo menos a compreensão de que haveria empenho oficial em sua aprovação.
"Mudou muito", afirma Pedro Malan. Então funcionário graduado do Banco Mundial, ele acompanhou a frieza como era tratado o governo brasileiro, especialmente depois da moratória em 1987.
Durante o regime militar, os desentendimentos levaram, por exemplo, à suspensão de acordos de cooperação militar. Em 1986, quando veio aos Estados Unidos, o então presidente José Sarney foi surpreendido por uma crítica de Ronald Reagan nas cerimônias da Casa Branca, devido a práticas protecionistas.
Veio Fernando Collor e os norte-americanos cultivaram a esperança de que, enfim, teriam um interlocutor.
Com suas idéias nacionalistas, Itamar Franco não inspirava confiança nem a convicção de que teria porte para se destacar entre as lideranças da América Latina.

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