São Paulo, sexta-feira, 28 de abril de 1995
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Corrupção desorganizada

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Quando foi realizada a Eco-92, já havia se iniciado o processo que derrubaria o presidente Fernando Collor de Mello. O irmão havia feito as denúncias, embora sem as provas que só viriam depois -e em tal quantidade que a situação ficaria insustentável para o ex-presidente.
No clímax da reunião internacional em defesa do meio ambiente, a estrela de Collor atingiu o poundiano "punto luminoso". Alguns setores da mídia (os mesmos de sempre) não fizeram por menos. Lembro o título de um artigo que chamava Collor de "estadista do século".
Não faz tanto tempo assim. O estadista do século despencou -e grande parcela da mídia prontamente o abandonou, colocando os ponteiros em busca de outro estadista do século. É difícil viver sem esse norte que exerce fatal atração na bússola dos informadores de opinião.
Já comentei o assunto, mas insisto. Considero sensata a declaração presidencial de que não há mais corrupção organizada. Como o Brasil não chega a ser exemplo de organização em campo algum, deve-se concluir que há corrupção, embora desorganizada.
O recuo presidencial na questão das coordenadorias da Caixa Econômica é um sintoma dessa organizada desorganização. Organizada e até coordenada. Sabe-se que parte do dinheiro oficial sai dos guichês da Caixa Econômica. É uma torneira pródiga na hora de pagar um serviço superfaturado ou inexistente.
Daí a pressão feita para que os manobreiros dessas conexões continuem os mesmos, dependentes e serviçais dos mesmos grupos pendurados no poder. Até que, pensando bem, o presidente da República foi injusto para com a engrenagem montada há anos e que permanece atuante -pois nenhuma mudança de poder se verificou com a posse de FHC: ele continua o que existia.
A engrenagem da corrupção nada tem de desorganizada. Pelo contrário: é mais organizada do que o próprio governo. Na hora de recuar, não foi ela que recuou.

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