São Paulo, sábado, 29 de abril de 1995
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Engavetamento

Parece não haver dúvidas quanto à necessidade de ajustes no Plano Real, e as medidas restritivas da última semana atendem em parte às expectativas. Mas o fato de existir consenso quanto ao diagnóstico não é garantia de consenso ou tranquilidade na recepção das medidas.
O ministro da Fazenda, Pedro Malan, por exemplo, já está em campo criticando o que qualifica como "choradeira" do comércio. Mas para os principais afetados as medidas causam uma apreensão até certo ponto justificada. Especialmente para os pequenos lojistas, não se trata de calibrar margens de lucro ou simplesmente alterar planos de investimento ou de reposição de estoques. Essa sintonia fina será possível para os grandes, capazes até mesmo de continuar bancando com recursos próprios o giro de cheques pré-datados.
Ocorre que para parcela não desprezível de empresários de menor porte ou em regiões mais distantes dos centros econômicos do país as medidas do governo podem colocar em questão as suas possibilidades de sobrevivência. E chega a 48% do produto nacional a participação de micro, pequenas e médias empresas comerciais, segundo Gerson Gabrielli, da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas.
Entretanto, se o impacto maior e mais imediato será sobre os pequenos, é ilusão imaginar que as ondas do choque não venham a atingir outros setores e empresas de maior porte. Sobrepõe-se à dificuldade de ajustar a economia o desafio de manter um crescimento moderado, mas sem precipitar uma recessão.
Ministros e outros membros da equipe econômica têm repetido incansavelmente que sua intenção é tão somente reduzir a marcha da economia, e não freá-la bruscamente. A situação da economia, entretanto, assemelha-se hoje a uma estrada sob névoa crescente. Até mesmo uma desaceleração cuidadosa corre o risco de criar um engavetamento, vitimando todos os que se dispuseram a apostar na estabilidade com crescimento.

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