São Paulo, sábado, 29 de abril de 1995
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O abandono do sistema hidrelétrico

LUIZ PINGUELLI ROSA

O sistema hidrelétrico brasileiro, apesar da dificuldade para investir hoje, é o melhor dos países não-desenvolvidos. As estatais elétricas não estão isentas dos erros que marcaram o Estado: obras caras, usos partidários. Mas sua venda não resolve a apropriação privada do que é público.
Visa tapar buraco do déficit do governo. Ou ser simpático aos investidores estrangeiros. E se o buraco continuar aumentando e o país não dispuser de instrumentos regulatórios e de política energética para seu desenvolvimento?
A responsabilidade pelo suprimento de energia elétrica continua com a União. Se as concessionárias não investirem na expansão, como ocorreu com a antiga Light, este será um problema do governo. A sociedade não poderá ficar sem luz e as indústrias sem força.
Hoje o Brasil tem a vantagem comparativa de ter energia barata e usar a hidrelétrica, renovável. Com a privatização a tarifa aumentará, se ativos amortizadas já pagos pelo consumidor forem revalorizados na venda. A alternativa é dá-los, quase de graça.
O capital privado no setor elétrico privatizado, na Argentina e na Inglaterra, busca remunerar-se a 15% ou 20% ao ano. As tarifas nesses países aumentaram. O setor público almeja 10% e contenta-se com 5%.
A hidreletricidade será abandonada na expansão, pois o investimento em termelétrica é menor e o retorno é mais rápido para o capital privado. Mas o custo de energia por elas gerada é maior, pago pelo consumidor. E incerto, pois depende do preço futuro dos combustíveis fósseis, que poderão ser taxados internacionalmente por causa da poluição atmosférica global -assunto tratado na reunião da ONU em Berlim nestes dias.
Os investimentos privados deveriam ser atraídos para: conclusão de obras; co-geração nas indústrias, como a alcooleira, com excedente de bagaço de cana utilizável em termelétricas; conservação de energia e aumento da eficiência no uso final. Nada disso é feito na medida necessária.
A indústria alcooleira está abandonada e será varrida do mapa se a emenda do monopólio do petróleo passar. Com poucas exceções, as parcerias para obras com o setor privado estão entravadas pela inação do governo, que propõe a venda de usinas acabadas.
As empresas elétricas serão melhor administradas se houver competição? O monopólio natural seria restrito à transmissão e distribuição, abrindo-o na geração e na comercialização. Isso nem sempre deu certo: o sistema elétrico inglês piorou e o argentino vai mal. O francês, com o monopólio vai bem, o norueguês, o holandês também, mantendo a presença estatal, que é nos EUA maior do que no Brasil, em termos de potência e energia gerada, como mostra livro recente de Christian Stoffaes.

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