São Paulo, segunda-feira, 1 de maio de 1995
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Fãs ainda 'choram' a morte de Senna por todo o mundo

ANDRÉ FONTENELLE
DE PARIS

Fãs ainda `choram' a morte de Senna por todo o mundo
Torcedores falam, por computador, sobre o acidente a pedido da Folha
Assim como o dia em que o homem chegou à Lua ou em que o papa João Paulo 2º sofreu um atentado, o dia da morte de Ayrton Senna ficará gravado na memória de muitas pessoas.
A pedido da Folha, fãs do automobilismo no mundo inteiro enviaram por correio eletrônico, através da rede de computadores Compuserve, mensagens contando como viveram o 1º de maio de 94.
Leia, a seguir, trechos dessas mensagens.
ESTADOS UNIDOS
``Acordei para assistir a prova às 4h45. Quando vi Senna sair da pista, pensei: `Merda, três abandonos seguidos'. Quando o carro parou e ele não saiu, meu coração parou.
Ao saber que ele sofrera ferimentos graves na cabeça, acordei meu marido, que é brasileiro.
Quando soube da morte cerebral, não pude acreditar. Liguei para um amigo no Rio para conferir. Ao desligar, sentei-me no chão e chorei como nunca na minha vida. Meu marido me abraçou. Choramos por uns 20 minutos.
Fui ao GP Brasil deste ano. Fiquei desapontada com tão pouca homenagem ao Ayrton.
Na saída do cemitério, chorava descontroladamente. Minha cunhada tentou me consolar em português. Só entendi uma parte. Talvez eu não quisesse entender. Ainda não quero acreditar que é verdade." Colleen Magee, 27, cidade de Sparks.

``Tinha gravado a corrida, para vê-la depois. Quando eu estava saindo para o trabalho, minha mulher, que assistira ao noticiário, gritou: `Senna morreu!'
Achei que ela fizera confusão com Ratzenberger. Mas, ao abrir o jornal no trem, a foto de Senna estava na primeira página. Tive vontade de dizer a todos no vagão que uma lenda das corridas tinha desaparecido.
Aquele dia permanecerá gravado na minha cabeça, como o dia da morte de John Lennon ou da explosão do ônibus espacial." Iori Suzuki, 32, Nova York.

``Eu esperava mais coisas ruins naquele fim-de-semana, depois do acidente de Ratzenberger; uma premonição, como muitos outros disseram depois.
Após o incidente da largada (fragmentos de carros atingiram torcedores), pensei que nada mais pudesse ocorrer e relaxei.
Quando a prova recomeçou, torci para que Schumacher passasse Senna. Então houve a batida.
Soube instantaneamente, no meu coração, que ele se fora. Esperei horas para ouvir que estava errada. Não estava. Senti-me culpada por ter esperado a tragédia e tê-la visto, por ter desejado um desfecho que tirasse Senna da liderança." Susan Zenel, 39, Washington.

``Obtive uma credencial de fotógrafo para o GP. Soube que Ayrton batera, mas estava na pista tirando fotos. Nos boxes, ouvi o anúncio na TV, primeiro em italiano: `E morto Senna!'
A primeira coisa que me tocou foi o silêncio na área dos boxes. Todo o ruído e as conversas pararam, substituídos por sussurros e lágrimas.
Vendo o vídeo meses depois, uma coisa que me espantou foi o instante em que puseram Ayrton no helicóptero.
Sid Watkins, que conheço bem, não o acompanhou a bordo. Conhecendo sua especialidade, neurocirurgia, achei que significava que não havia esperança." Raymond Ninness, 53, East Point.

``Estava visitando meu primo em Long Beach, no dia 1º de maio. Assistimos a um VT da prova, à noite, em um bar. Tínhamos bebido razoavelmente, mas admito que foi um choque.
Não gostava de Senna, assim como de nenhum outro esportista em geral. Para ser sincero, minha mulher e eu o considerávamos pirado, na pior das hipóteses, e um imbecil, na melhor das hipóteses.
Mas o homem era um piloto impressionante... realmente impressionante. Ele era bom para seu esporte e seu país.
Acho forte demais dizer que ele era amado no mundo inteiro. O interessante é a forma como ele era visto em seu país.
Ver mulheres adultas beijando o capacete de Senna no funeral foi uma das cenas mais bizarras da história da televisão.
O público brasileiro pode ficar tranquilo: Senna era conhecido, festejado e criticado, e será sempre respeitado pelos torcedores do mundo inteiro; mas nunca da forma como era em seu país." Richard Straude, 34, Gulf Breeze.

REINO UNIDO
``Sou corredora de kart e quero chegar à F-1. Naquele dia, fui a Coventry assistir à final de um torneio de speedway (motociclismo em pista oval de areia).
Soube que Senna tinha batido quando ouvi a conversa de espectadores à minha frente. Voltei para o carro e mamãe disse que talvez ele não sobrevivesse.
Ficamos com o rádio ligado. Quando ouvi que ele morrera, deitei no banco de trás e comecei a chorar. Senti um vazio por dentro.
A coisa de que me lembro melhor foi, naquela noite, um comentário de Murray Walker, o mais famoso locutor britânico de GPs: `Eu me lembro de Ayrton Senna. E é terrível ter que usar essa palavra.' Era visível que ele havia chorado. Isso me arrasou." Leanne Winfield, 16, Leeds.

CANADÁ
``Quando Senna não saiu do carro e, pior, quando o comissário de pista decidiu esperar pelos médicos, percebi que era sério.
É terrivelmente injusto que eu tenha aceitado tão rapidamente a morte de Ratzenberger e tenha ficado tão chocado com a de Senna.
Nunca imaginei que teria um vínculo tão forte com outro piloto depois da morte de Gilles Villeneuve. Mas aconteceu e ainda dói." Ferdinand Trauttmansdorff, 37, Ottawa.

HOLANDA
``Na véspera eu vira os acidentes de Ratzenberger e Barrichello. Já estava com um mau pressentimento. Quando o acidente ocorreu, mal pude acreditar. Mas era Senna, ele ia sair do carro e vencer o GP seguinte.
Durante e depois da corrida, fiquei mudando de canal, à procura de notícias. Alguns dias depois, minha mulher gravou um documentário sobre ele. Até hoje não pude vê-lo." Marcel van Beuzekom, 27, Oosterhout.

AUSTRÁLIA
``Sempre assisto às provas, embora passem de madrugada. Quando houve o acidente, fiquei chateado, porque ele não ia terminar outra vez. Mas, quando vi sua cabeça balançar, esperei o pior.
Não pude dormir naquela noite. Tive pesadelos, e, toda vez que fechava os olhos, revia o acidente claramente. Meu único desejo é levar flores a seu túmulo." Antero Bonifacio, 22, Melbourne.

NOVA ZELÂNDIA
``Sou fã de automobilismo desde os anos 70. Chorei ao ver na TV a morte de Gilles Villeneuve. Meu interesse pela F-1 acabou. Só voltei a vê-la em 1988, quando a TV mostrou (coisa rara então) o GP do Japão.
Foi o GP em que um piloto fez a mais incrível das corridas de recuperação, saindo do 14º para o 1º lugar e vencendo. Eu disse VENCENDO. Era Ayrton Senna.
Para mim, 1º de maio foi o dia em que o automobilismo perdeu dois campeões: Roland Ratzenberger -um dos poucos eleitos a competir na categoria máxima do automobilismo; e Ayrton Senna -um dos poucos eleitos a mudar a maneira de competir na categoria máxima do automobilismo." Stephen McIvor, 26, Auckland.

SUÉCIA
``A primeira coisa que pensei, quando Ratz (Ratzenberger) bateu, foi que ele estava morto, pela forma como sua cabeça estava solta no cockpit. A mesma coisa com Senna, ele me parecia morto.
Senna representava o esporte para muitas pessoas. É isso que faz da morte de um homem, que é uma tragédia relativamente menor em um mundo cheio de sofrimento, uma tragédia de verdade para o esporte e os torcedores." Joakim Tarnstom, 32, Bromma.

INDONÉSIA
``Vivo no meio da selva. Minha ligação com o mundo real é através da Internet ou Compuserve. Soube da morte de Senna pelo computador.
Até hoje espero ver seu nome nas listas de grid de largada -na pole position, naturalmente! Como Jim Clark, Jochen Rindt, Piers Courage, Pedro e Ricardo Rodríguez, Peterson e tantos outros, ele se foi, mas nunca será esquecido." Gordon Greaves, 47, Iriã.

ALEMANHA
``Ainda me lembro bem do início da transmissão do GP de Imola, quando John Watson (ex-piloto irlandês) comentou a imagem de Senna no carro, sem capacete: `Senna parece pensativo diante da perspectiva das voltas do GP.'
Pensei: `NÃO, engano seu, John'. Não sei em que Senna estava pensando, mas seu rosto mostrava algo além das simples preocupações de mais um GP.
Depois foi dito que ele tivera um pressentimento de que algo terrível ia acontecer. Para mim, era o que mostrava seu semblante.
Cresci como fã de Jochen Rindt (piloto austríaco, morto em 1970) e chorei com seu fim trágico. Desde então, nunca a F-1 me emocionara tanto.
Tive que chorar ao ver o acidente -nisso, também, John Watson errou em seu comentário. Era visível que algo fatal ocorrera." Jasper Marquardt, 35, Berlim.

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