São Paulo, segunda-feira, 1 de maio de 1995
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Quartetos de Beethoven saem do estúdio

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

Chega ao mercado brasileiro uma versão ao vivo em CD da integral dos quartetos de cordas do compositor alemão Ludwig van Beethoven (1770-1827).
As 17 composições que formam a obra máxima do músico saem do estúdio e recebem novos matizes.
São dez CDs embalados em três caixas realizados pelo Quarteto Alban Berg, de Viena, em concertos públicos na Konzerthaus da capital austríaca em junho de 1989.
Os álbuns saíram na Europa há dois anos. Causaram sensação por duas razões. A ordem em que o repertório está disposto não é cronológica, mas temática. Em segundo lugar, o Alban Berg já havia lançado uma integral de estúdio dos quartetos em 1980. A nova leitura é ainda melhor.
A gravação de 1980 é até hoje uma das melhores realizações no gênero. Compara-se às interpretações dos quartetos Vegh e Juilliard (esta também feita ao vivo), ambas da década de 80.
O Alban Berg foi fundado em 1970. Tem 25 CDs no catálogo e goza de alta reputação. A primeira abordagem de Beethoven feita por ele se destacava pela variedade de climas que imprimimia às peças, como se a cada uma delas correspondesse um estilo.
A nova versão traz, além da ressonância natural de uma execução pública (ouvem-se aplausos no início e final de cada obra), uma carga expressiva bem mais forte do que a primeira. Pequenas falhas e ruídos pontuam os registros.
Para o primeiro violinista do grupo, Guenter Pichler, a versão ao vivo é superior a de estúdio por causa da experiência musical típica da performance em público.
``Não é verdade que um artista obtenha melhores resultados em disco do que na realidade", diz Pichler. ``A gravação tem um limite de tempo e você é obrigado a ouvir seus próprios defeitos. É uma pressão enorme."
A distinção mais marcante entre as duas integrais está nos movimentos lentos. Ao vivo, o grupo surge tenso; ralenta mais os andamentos, tornando-os extáticos. Beethoven parece prender os músicos às suas notas longas.
O fato se evidencia no ``Adagio ma no troppo e molto espressivo" do ``Quarteto nº14 em Dó Sustenido Menor, Op.131" (1825), tido pelo mestre como sua obra-prima.
A gravação anterior respeita o metrônomo. O movimento segue a trote conforme o andamento indicado pelo compositor.
Na leitura mais recente se dá uma angústia da influência às avessas. As notas se dilatam à náusea, como se Beethoven antecipasse a música plana do estoniano Arvo Paert, 59. Isso, claro, se deve mais aos intérpretes do que ao autor.
Um toque contemporâneo marca a nova versão e pode desagradar o ouvinte conservador. O traço sublinha até mesmo a ordem do programa nos CDs.
Os discos foram gravados em seis noites. O programa de cada uma delas foi mantido. O grupo toca uma obra da juventude e outra pertencente à fase final.
Assim, no terceiro CD do primeiro volume, o ``Op.18 nº3" -pertencente à série de seis peças publicada em 1800-, antecede o ``Op. 130 nº 13", de 1825, do conjunto dos cinco últimos quartetos do mestre (opus 127, 130, 131, 132 e 135).
Ao registrar pela segunda vez a mesma obra, o Alban Berg demonstra a imortalidade da fonte.
Os últimos quartetos concentram o máximo de informação e complexidade a que uma partitura pode almejar.
Formam um dos ápices da música, tanto pela reelaboração das formas passadas como pelo avanço de linguagem. Estes impeliram a música à desconstrução do sistema tonal e da sintaxe sonora, que só viria a ocorrer no século 20.
O mandato da obra ainda não foi revogado. Renova-se a cada versão.
Disco: 17 Quartetos de Beethoven
Músicos: Guenter Pichler e Gerarhd Schulz (violinos), Thomas Kakuska (viola) e Valentin Erben (violoncelo)
Lançamento: EMI-Odeon
Quanto: R$ 25 (o CD, em média)

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