São Paulo, domingo, 18 de junho de 1995
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Cotas para automóveis ameaçam Mercosul

FERNANDO CANZIAN; JOSÉ ROBERTO CAMPOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A imposição de cotas para automóveis ameaça interromper o tango que Brasil e Argentina vêm dançando no âmbito do Mercado Comum do Sul (Mercosul). Ironicamente, o presidente argentino, Carlos Menem, ficou furioso com o governo brasileiro por adotar uma política idêntica à sua.
Depois de colher sucessivos déficits comerciais com seu Plano Cavallo -que estabelece paridade fixa de um dólar por peso- a Argentina recheou com cotas sua política externa -de automóveis a freezers e geladeiras. O país luta para recuperar seu equilíbrio, as exportações vem reagindo e o governo conta com obter um déficit muito pequeno em 95 -em boa parte graças ao Brasil.
À beira de uma recessão, o governo argentino aguardava que o dinamismo da economia brasileira não sofresse grandes abalos com as medidas anticonsumo. As exportações para o Brasil eram um alívio para a redução das atividades no mercado argentino.
As cotas, agora no limbo à espera de uma solução de consenso entre os dois governos, dariam um golpe forte na Argentina.
Como as vendas locais caíram 30% desde o início do ano, os argentinos passaram a destinar 63% das exportações de carros e peças ao Brasil.
Sem restrições, as perspectivas de negócios futuros para os argentinos são brilhantes. Os carros produzidos na Argentina não pagam a alíquota de 70% estabelecida pelo Brasil para o resto do mundo.
Com essa vantagem contra os grandes concorrentes mundiais, a Argentina esperava receber os investimentos de montadoras internacionais que, com o Mercosul, vêem como um bom negócio a proximidade de um dos mercados que mais crescem no planeta.
Os números falam por si. O Brasil tem um veículo para cada 11,3 pessoas, a Argentina um para cada 5,5. A idade média da frota brasileira -14 milhões de carros- atinge 11,2 anos e exige uma renovação em grande escala.
O Brasil corre o risco de irritar outros países além da Argentina. O advogado Tercio Sampaio Ferraz Junior não descarta ``uma possível interpelação" da Organização Mundial de Comércio (OMC).
Pelas regras da OMC, que passaram a regular o comércio internacional em janeiro passado, os países signatários podem adotar determinadas restrições, como aumentos de tarifas, desde que temporárias e bem fundamentadas.
As restrições podem se estender por quatro anos, renováveis nos países em desenvolvimento.
O Brasil deve argumentar com a OMC que adotou as cotas como parte de sua política industrial para atrair investimentos.
Neste ano, o Brasil já aumentou brutalmente e ``em caráter transitório" as alíquotas para eletroeletrônicos, carros e calçados.
Mas mesmo países desenvolvidos como Itália, Espanha e França, também partiram para cotas quando sentiram-se ameaçados. Os três, por exemplo, têm cotas entre 5% a 9% para carros japoneses.
A OMC tem uma batalha maior entre concorrentes mais importantes a resolver, sobre o mesmo assunto, diz Ferraz Filho. Se até o dia 28 de junho o Japão não abrir seu mercado a produtos dos Estados Unidos, os EUA fixarão alíquotas de 100% para os carros japoneses, que hoje detém a preferência de um em cada quatro americanos.
(FCz e JRC)

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