São Paulo, domingo, 18 de junho de 1995
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Casas de luxo ocupam lotes de sem-terra

PAULO MOTA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM FORTALEZA

Erramos: 21/06/95
Diferentemente do publicado à pág. 1-14 de Brasil no último domingo, o programa de irrigação para trabalhadores rurais em Paraipaba (CE) prevê a cessão de lotes de 40 mil metros quadrados, e não 400 metros quadrados.
Casas de luxo ocupam lotes de sem-terra
Políticos, comerciantes, fazendeiros e profissionais liberais transfomaram um projeto de irrigação para trabalhadores sem-terra no norte do Ceará em área de casas de luxo para veraneio.
A infra-estrutura de abastecimento de água e energia elétrica no local foi paga pelo Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra a Seca), órgão do Ministério do Meio Ambiente. O projeto fica em Paraipaba, 101 km a noroeste de Fortaleza.
Segundo levantamento do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Paraipaba, 370 dos 807 lotes foram transformados em áreas de lazer privado.
O projeto Curu-Paraipaba, inaugurado em 1975, ocupa área de 30 km2, equivalente à ilha de Fernando de Noronha (PE). Segundo o regulamento, cada colono ocupa um lote de 400 m2 -ou cinco campos e meio de futebol.
O Dnocs já investiu cerca de R$ 20 milhões no projeto, dotando os lotes de estrutura para irrigação e energia elétrica, além de construir escolas e estradas. A maioria dos lotes tem casas construídas gratuitamente pelo órgão.
Só podem ser colonos, pelo regulamento, trabalhadores rurais que não sejam proprietários de terras e que tenham vínculos com a área do projeto (ex-parceiro, rendeiro, assalariado). Isso exclui fazendeiros, industriais, comerciantes e funcionários públicos.
O terreno de cada lote pertence à União, que cede ao colono seu uso por um contrato de concessão. Ele perde a concessão se deixar de usar o terreno para fins de agricultura por mais de dois anos.
Apesar de o Dnocs dispor de 54 funcionários para fiscalização, os lotes são ``vendidos" por preços entre R$ 8.000 e R$ 30 mil.
Segundo Antonio Barroso, 50, diretor do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Paraipaba, os colonos começaram a passar adiante os lotes a partir de 1986, quando parte deles teve dificuldades para saldar as dívidas bancárias contraídas para financiar a safra durante o Plano Cruzado.
``A situação piorou em 1990, quando o Pró-Álcool acabou e o governo deixou de comprar cana-de-açúcar", diz Barroso.
O Dnocs transferiu em 1991 parte da coordenação aos próprios colonos, que não conseguiram viabilizar a substituição da cana-de-açúcar por novas culturas.
Sem a fiscalização do Dnocs, pessoas de classe média e alta de Fortaleza transformaram os lotes em casas de veraneio.
Privilegiadas pela infra-estrutura, as chácaras ficam a 15 km da praia da Lagoinha, uma das mais belas do litoral cearense.
Apesar de o regulamento só permitir a ocupação de um lote por colono, o ex-prefeito de Fortaleza Barros Pinho (PMDB) ocupa dois, onde mantém um estábulo.
Pinho afirmou que adquiriu os lotes de um colono com o aval do Dnocs. ``Está tudo regularizado. Consegui até um financiamento do Banco do Nordeste do Brasil".

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