São Paulo, segunda-feira, 26 de junho de 1995
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Estrutura X conjuntura

O aspecto talvez mais surpreendente do debate da última sexta-feira sobre o Plano Real, no auditório da Folha, foi a constatação de que entre os economistas que defenderam e o que atacou o Plano Real surgia uma convergência, uma concordância no diagnóstico dos problemas que afetam o real.
Comentando as críticas de Aloizio Mercadante, tanto André Lara Resende quanto José Roberto Mendonça de Barros reconheciam as dificuldades de reverter o déficit comercial, a fragilidade do ajuste fiscal conseguido até aqui, a impossibilidade de conviver por muito mais tempo com juros elevadíssimos ou os riscos que ameaçam a safra agrícola de 1996.
Mendonça de Barros, entretanto, ressaltou a parcialidade dessa convergência de diagnósticos que, não atingindo os fundamentos das análises, não conduz à mesma terapia.
Há uma divergência essencial entre críticos e defensores do Plano Real que o debate da Folha desnudou com rara nitidez. Para o governo, os desequilíbrios são transitórios, fazem parte de uma conjuntura adversa que está sendo enfrentada com flexibilidade e criatividade.
Reencontrar o equilíbrio no câmbio, nos juros, nas finanças públicas e no crescimento econômico é só uma questão de tempo. Porque há alguns anos estão em curso mudanças nas estruturas, tais como a liberalização comercial, o governo tem esperança na reversão da conjuntura e aposta na estabilização.
Já para a oposição tudo o que se manifesta como desequilíbrio conjuntural é na realidade expressão de um desajuste estrutural mais profundo, que a política do governo aliás só faria aprofundar.
Dar tempo ao tempo, desse ponto de vista, significará apenas reiterar a armadilha dos juros altos, liquidar patrimônio público, arrochar os salários e submergir a indústria doméstica num maremoto de importações subsidiadas por um câmbio totalmente irrealista.
O que é estrutural para um é conjuntural para o outro, ainda que na aparência os desequilíbrios sejam os mesmos. É como se dois médicos olhassem o mesmo termômetro e, enquanto um vê na febre alta o sintoma de uma gripe passageira, o outro alerta para o avanço irrefreável de uma pneumonia letal.
É cedo para decidir quem tem razão. O debate e os ajustes ainda prosseguem. E a febre também.

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