São Paulo, terça-feira, 27 de junho de 1995
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Buenos Aires busca as raízes

LUIS GROSSMAN
DO "LA NACIÓN"

Buenos Aires conseguiu escapar das margens do imenso rio ``cor de leão", como escreveu Borges.
O rio da Prata -em torno do qual ela cresce desde a lenta conquista dos pampas- foi subitamente reencontrado.
Os habitantes do porto, ou portenhos, como são conhecidas as pessoas de Buenos Aires, reencontram suas raízes. Essa nação de imigrados desembarcou lá, no porto.
O conjunto de velhos armazéns que se estende pelos diques do Porto Madero, hoje em desuso, está sendo reformado.
O rio da Prata foi o teatro de uma política arquitetônica inteligente para nosso século. Buenos Aires o reconquistou aos poucos, ampliando seus limites.
Antes disso, a cidade vivia dentro de limites estreitamente definidos: a avenida General Paz e o Riachuelo -um riozinho estreito e ridículo em comparação com o imenso rio da Prata, no qual desemboca.
A terceira fronteira é exatamente o rio da Prata. Suas margens foram modificadas por sucessivas obras que terminaram por alterar sensivelmente seu traçado.
Foi incorporada uma espécie de península artificial. Formada pelos restos de demolições ali depositados no final dos anos 60, transformou-se uma imensa área verde.
Hoje o bairro do porto goza de bastante prestígio. A grave crise que afetou a indústria da construção nos últimos 15 anos pode ser vista como uma vantagem.
Enquanto sua periferia explode, com mais de 10 milhões de habitantes, Buenos Aires não sofre nenhuma urbanização frenética. Sua população -3 milhões- se mantem estável há 40 anos.
Esse período de inatividade coincidiu com uma fase de transição na arquitetura internacional, durante a qual o pós-modernismo e o anticonstrutivismo deram lugar a algumas loucuras contemporâneas.
No caso de Buenos Aires, elas mal alteraram a imagem da cidade. Os prédios respeitam o relevo plano -a grande maioria não tem mais de dois andares e apenas alguns bairros, entre eles o de Belgrano, têm alto nível de densidade. O resto da cidade conserva seu ar de vila.
Na zona do porto, nobres prédios de tijolos e três andares hoje abrigam escritórios, um campus universitário, bares e restaurantes, com vistas magníficas -serenas extensões de água emolduradas pelos diques e pontilhadas, ao longe, por navios.
Apesar desse novo pulmão, Buenos Aires ainda é uma cidade compacta e, por isso mesmo, frenética.
Nas últimas décadas, seus habitantes vêm migrando lentamente para os subúrbios. Muitas famílias foram atraídas pela segurança oferecida pelos condomínios fechados e fartamente arborizados, onde todos conhecem seus vizinhos.
Mas os portenhos mais ferrenhos não abandonam a vista para o mar e seus cafés, que ganharam uma nova vida com a retomada econômica do país.

Tradução de Clara Allain.

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