São Paulo, quinta-feira, 29 de junho de 1995
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Os juros e as reformas

ELVIO ALIPRANDI

O que mais perturba a vida de quem tem empresa, atualmente, são as elevadas taxas de juros. Cresce a inadimplência, trazendo junto a ameaça da recessão, por causa do alto preço que se paga pelo dinheiro. Corremos o risco, em consequência, de produzir menos num momento em que o Brasil precisa produzir mais e de estreitar o mercado de trabalho num momento em que a população brasileira tanto necessita de mais empregos.
Quem depende de recursos para iniciar, manter ou ampliar um negócio esbarra em taxas de juros que passam dos 30% ao ano. Como investir num cenário assim? Para muitos empresários, o caminho tem sido recorrer aos agiotas, que, circunstancialmente, estão cobrando menos pelo dinheiro. É sempre assim, em todos os tempos, em todos os países: quando os governantes exageram nas taxas de juros, a agiotagem aparece como opção, como remendo.
Nesse tipo de operação, todos perdem: o governo, que deixa de arrecadar; as empresas, que se utilizam de recursos de segunda classe; e também o país, na medida em que se alastra uma prática semiclandestina. É dever do cidadão consciente, portanto, alertar contra os juros exagerados. Temos que protestar, sem dúvida.
Mas existe um protesto mais eficiente no Brasil de hoje. O mais eficiente é mobilizar todas as nossas forças pelas reformas da Constituição. Dois anos atrás, perdemos a oportunidade de fazer a revisão, quando bastava a maioria simples dos congressistas para remover todo aquele entulho estatizante que se acumula em nossa Constituição. Sobra-nos, porém, a oportunidade de promover uma reforma ampla, objetiva, ainda que seja agora necessário reunir quatro vezes a maioria de dois terços -duas na Câmara e duas no Senado, em cada votação de emenda constitucional.
Por que, apesar dessa dificuldade, é mais eficiente mobilizar pela reforma? Porque os juros escorchantes (o próprio presidente da República usou essa expressão) são consequência do texto constitucional equivocado ao qual obedecemos desde outubro de 1988. Já que não passa por nossa cabeça a idéia de desobedecer à lei, resta-nos a alternativa de modificá-la democraticamente, como forma de eliminar de vez os entraves à produção.
Hoje, são os juros. Um ano atrás, era a inflação. Sempre existe um fator de perturbação da atividade empresarial, mas a causa -ninguém se engane- está lá, naqueles artigos concebidos sob inspiração da utopia socialista, sob influência da idéia de que a intervenção do Estado poderia garantir a prosperidade, o pleno emprego, a paz social.
Há várias décadas, na verdade, essa ilusão ideológica nos confunde e nos atrasa. Como resultado, a máquina estatal incha, a carga tributária aumenta, o peso do Estado sobre os ombros do contribuinte cresce, a atividade empresarial se torna cada vez mais sacrificada.
O pior é termos que enfrentar, ainda, a incerteza crônica de nunca sabermos por quanto tempo vão durar as regras do jogo que somos chamados a jogar. Quando menos se espera, desaba sobre nós um pacote, despenca uma maxidesvalorização, surge um bloqueio, aparece um congelamento, nasce uma nova moeda. Tudo isso nos ocorre enquanto nossos concorrentes internacionais se beneficiam de subsídios, incentivos e contratos duradouros em seus países.
Felizmente, de um ano para cá, começou a soprar no Brasil a boa brisa da revolução de idéias e de conceitos. A população percebeu a necessidade de mudar e elegeu governantes comprometidos com a mudança.
Até aqui, as atitudes governamentais apontam na direção correta, voltando a encaminhar as privatizações e propondo ao Congresso reformas que de fato tendem a dar novo alento à nossa economia. Estamos pondo uma pedra sobre os monopólios. Estamos atraindo o capital internacional. Nossos congressistas estão dando provas de que, querendo, poderão vir a reformar a Previdência e modernizar a legislação trabalhista.
Existe, enfim, a possibilidade concreta de reformar a Constituição. Para isso, é indispensável que cada cidadão e cada entidade se empenhem nessa luta, com determinação. Temos que continuar alertando contra os perigos dos juros altos, assim como já alertamos contra a inflação, a carga tributária e tantos outros transtornos da vida de quem produz no Brasil. Mas nossa prioridade, hoje, é a reforma do texto constitucional.

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