São Paulo, quinta-feira, 29 de junho de 1995
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Contribuição de emergência para a saúde

<UN->DAVID CAPISTRANO FILHO

Estando nas mãos de Jatene, os recursos arrecadados com certeza chegarão a seu destino
DAVID CAPISTRANO FILHO
Sou favorável à criação de uma contribuição financeira para atender a demandas urgentes do setor da saúde, conforme proposta do ministro Adib Jatene.
O imposto é necessário para impedir um virtual colapso do Sistema Único de Saúde (SUS). Colapso cujo principal responsável é a equipe econômica do governo federal, que, ao alegar falta de recursos e/ou a necessidade de um rígido controle do déficit federal, vem deixando à míngua as áreas sociais do poder público.
São muito curiosas essas alegações. Veja-se, por exemplo, a destinação que vem sendo dada ao Fundo Social de Emergência (FSE): alega-se falta de recursos, mas estranhamente há dinheiro do FSE para sustentar frivolidade, como a imprensa denunciou recentemente.
Quanto ao déficit, sabe-se que o governo contém gastos que beneficiariam a maioria pobre da população brasileira, enquanto não reluta um minuto em pagar altas taxas de juros pelos papéis do Tesouro que se encontram nas mãos dos banqueiros e especuladores -hoje a fonte mais importante da dívida federal. Pior, pela imoralidade flagrante, o saque a R$ 1 bilhão do Tesouro para assegurar o voto da bancada ruralista a favor do desmanche da Constituição de 1988.
Ao mesmo tempo, a equipe econômica faz de tudo para impedir a elaboração de orçamento separado para a Seguridade Social (saúde, previdência e assistência), conforme determina o artigo 195 de nossa Constituição. Ao agirem assim, os ministros da área econômica ganham uma considerável margem de manobra para dar destinações outras aos recursos arrecadados pelo sistema previdenciário.
Essa série de atitudes não se coadunam com as declarações do presidente da República, feitas antes de sua posse, de que os ministérios da área econômica não dariam a última palavra em seu governo. Sobretudo, tais atitudes levaram o SUS a um estado de quase calamidade pública. Hospitais estão sendo fechados. A transferência de recursos para Estados e municípios atrasa.
Circunstancialmente, em função dos atrasos e das dívidas acumuladas, não há como fazer funcionar o sistema a contento, mesmo se todos os recursos a que a saúde tem direito no Orçamento federal fossem mobilizados. É urgente um novo fluxo de recursos, nem que seja por um tempo limitado.
Impõe-se de saída refutar a idéia, tão difundida quanto falsa, de que a carga tributária brasileira é alta. Não é: está provado que as grandes fortunas e as grandes empresas praticamente não pagam impostos, que recaem apenas sobre os assalariados, a classe média, os pequenos e parte dos médios empresários.
A criação de novos impostos tende a ser impopular em quase todos os lugares, especialmente no Brasil. Os contribuintes sentem-se enganados, já que escutam diariamente denúncias de má utilização do dinheiro público, além de guardarem uma profunda desconfiança em relação aos que o administram.
Não se resolve esse problema apenas rendendo-se aos fatos. É preciso, ao contrário, separar o joio do trigo, incentivando-se a criação de programas exemplares de gestão de impostos, que atendam as justas expectativas da população.
A contribuição para a saúde reúne todas as condições para ser assim. Primeiro, porque terá um objetivo emergencial, bem definido, o que a maioria da sociedade vê como justo: salvar vidas. E ele se tornará ainda mais aceitável se a lei que o criar previr mecanismos para que a sua administração seja feita com a maior visibilidade possível: publicação de uma prestação de contas mensal da receita e da despesa, divulgação regular dos benefícios gerados e assim por diante.
Por último, e não menos importante: é preciso levar em conta que a pessoa que o propõe, o ministro Adib Jatene, goza hoje da confiança tanto da sociedade quanto do setor saúde. Estando em suas mãos, os recursos arrecadados com certeza chegarão ao seu lugar de destino.

DAVID CAPISTRANO FILHO, 45, médico sanitarista, é prefeito de Santos (SP). Foi secretário de Saúde em Bauru (administração Tuga Angerami) e em Santos (administração Telma de Souza).

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