São Paulo, sábado, 1 de julho de 1995
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Ministros explicam motivo das mudanças

Leia a íntegra das explicações dos ministros Pedro Malan, Paulo Paiva e José Serra e do presidente do Banco Central, Gustavo Loyola:

Ministro Pedro Malan - É um prazer estar aqui com vocês, dando início a mais uma de várias conversas desse tipo, em que procuramos, desde o início -na verdade, desde junho de 1993-, explicar a direção geral em que pretendíamos caminhar, no esforço de assegurar a estabilização da economia brasileira, com crescimento sustentado e com menor injustiça social.
Devo dizer que desde o início nós fizemos uma aposta. E foi o que nos levou, por exemplo, a recusar sugestões de dolarização da economia, de vinculação ao dólar de toda natureza. A aposta foi a seguinte: é possível, sim, apesar de uma experiência um tanto frustrante em algumas dimensões, apostar que nós podemos ter uma moeda nacional de poder de compra estável, com credibilidade, e que isso é algo de enorme significado para o Brasil, como é a moeda nacional com credibilidade e com poder de compra estável em vários países desenvolvidos no mundo. Esse é um objetivo que nós pretendemos alcançar. As medidas de hoje -eu quero frisar aqui- não se tratam, de forma alguma, de uma radical guinada de rumo. Não há aqui nenhuma grande surpresa. Na verdade a imprensa já vem praticamente -eu me acostumei já, em tom de brincadeira-, nos últimos dias, antecipando. Ela já exauriu todas as possibilidades. Tudo o que poderia acontecer de uma forma ou de outra já foi antecipado pela nossa investigativa, imaginativa e criativa imprensa brasileira, à qual eu quero mais uma vez aqui render de público a minha homenagem. De modo que não há nada, a partir do dia 1º de julho, que afete de forma significativa, em termos de sustos, sobressaltos e nervosismos, a vida do brasileiro que trabalha, que produz e que investe.
O que está sendo feito aqui não é um Real 2, não é uma mudança de rumo. É a continuidade de um processo. Um processo que teve início lá em meados de 1993 e teve continuidade com a exposição de motivos que apresentamos no dia 7 de dezembro de 93, dizendo que em algum momento de 94 nós criaríamos a URV, que o propósito da URV era assegurar um processo gradual e voluntário de recontratação, enquanto a URV não se transformava, ao adquirir a propriedade de meios de pagamento no real. O real, que teria lugar também sem surpresas e choques em algum momento de 94, como de fato ocorreu em 1º de julho do ano passado.
Dissemos também que a consolidação do programa de estabilização envolveria um movimento no sentido de uma gradual desregulamentação da indexação na economia brasileira, porque, como está anotado na exposição de motivos, o que a indexação faz é fazer com que a inflação de hoje seja determinada pela inflação de ontem, a inflação de amanhã pela inflação de hoje. Esse é um mecanismo de perpetuação e sustentação da inflação ao longo do tempo. Portanto, dissemos que nós iríamos caminhar sim -isso não é segredo para ninguém já há muito tempo- na direção de uma desregulamentação gradual e progressiva da indexação na economia brasileira. É a isso que esse conjunto de medidas aqui está se propondo.
Nós pensamos em organizar essa conversa aqui com uma rápida, breve introdução da minha parte. A parte da medida provisória, que diz respeito a salários e à Justiça do Trabalho será apresentada pelo ministro Paulo Paiva. Hoje, como é do conhecimento de todos, nós tivemos a reunião do Conselho Monetário Nacional, com várias decisões tomadas, que serão explicadas aqui pelo dr. Gustavo Loyola. O ministro José Serra, se o desejar, fará uso da palavra para colocar um fecho nesta apresentação, antes que nós tenhamos a série de perguntas.
Bem, nesta introdução geral, então, deixem-me comentar alguns aspectos da medida provisória em si. Os parágrafos 1 e 2, na verdade, representam a preservação de algo que nós consideramos uma conquista do real e uma direção na qual caminhar. Aqui, nós estamos dizendo o seguinte: há uma expressão natural da aposta no real como a moeda nacional de poder de compra estável e com credibilidade.
Nós estamos dizendo que toda e qualquer estipulação de pagamentos, de obrigações pecuniárias no território nacional, deverá ser feita em real pelo seu valor nominal. São vedados pagamentos expressos em ou vinculadas a ouro ou moeda estrangeira, ressalvado o que já dispõe o decreto-lei 857, que já permite, sob certas condições, pagamentos expressos ou vinculados a moeda estrangeira. Dizemos também que estão vedados, sob pena de nulidade, reajuste ou correção monetária expressa ou vinculada em unidades de conta de qualquer natureza e dizemos que, exceto o ressalvado no artigo 2º, a correção monetária, o reajuste de índices de preços gerais, setoriais ou que refutam variações de custo e produção estão também vedados sob pena de nulidade.
Isso foi um avanço que nós fizemos desde a URV, quando nós proibimos a indexação para contratos de duração de prazo inferior a um ano. O artigo 2 admite essa estipulação por prazos de duração em certos casos, que são os casos referidos nos parágrafos 1, 2 e 3 do artigo. São as condições em que é permitida a correção monetária e o reajuste por índice de preço.
O artigo 3 diz que contratos que envolvam setor público serão objeto de regulamentação a ser baixada pelo Poder Executivo.
O artigo 4 diz que contratos celebrados no âmbito de mercados financeiros, inclusive as condições de remuneração da poupança financeira, bem como a previdência privada fechada permanecem regidos por legislação própria.
O artigo 5 institui taxa básica financeira, sobre a qual o presidente do Banco Central, dr. Gustavo Loyola, terá algo a dizer no contexto das decisões de hoje do Conselho Monetário Nacional.
O artigo 6 diz que a Ufir terá uma periodicidade semestral, a partir de 1º de janeiro de 1996. Por que a partir de 1º de janeiro de 96 e por que semestral, alguém poderia perguntar. Na verdade, é importante chamar a atenção de que nós estamos nos movendo em uma estratégia gradual. Nós tínhamos a Ufir diária, depois passamos a ter uma Ufir mensal, agora uma Ufir trimestral até o final deste ano e semestral a partir de 1º de janeiro do ano que vem.
Por que não mudar agora, já a partir de 1º de julho? Porque a Ufir tem implicações para balanços de empresas e sobre bases tributárias. Mudanças ainda no exercício de 95, com efeitos de natureza fiscal ainda em 95, poderiam e certamente criariam problemas de conflitos com a anualidade e anterioridade de impostos. Mas a partir do ano que vem, ela será semestral.
Dizemos também que, a partir de 1º de janeiro do ano que vem, essas unidades de conta de municípios e Estados que existem hoje no Brasil ficariam extintas, mas os Estados, o Distrito Federal e os municípios poderão utilizar a Ufir nas mesmas condições e periodicidade adotadas pela União.
Dizemos também no artigo 8 -e isso é uma expressão de algo que vimos dizendo há tempo- que o Brasil é um país de dimensão continental, marcado por uma enorme diversidade em termos de regiões, atividades, setores e que, portanto, tem muito menos sentido no Brasil do que em pequenas economias do mundo falar num índice que expresse a verdadeira natureza da inflação brasileira, um indicador oficial de inflação. É sabido que existem enormes variações regionais de índices de preços, existem diferentes critérios que podem ser utilizados, e nós achamos que não tem sentido falar num índice oficial de inflação, que a diferença de todos os outros captura a verdadeira natureza da inflação brasileira. De modo que, como o IPC-r assumiu esse foro, essa característica, nós estamos dizendo que, a partir de 1º de julho de 95, este índice deixará de ser calculado e divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
Nas obrigações e contratos em que haja estipulação de reajuste pelo IPC-r, ele será substituído, a partir de 1º de julho, pelo índice previsto. Muitos contratos já prevêem como norma o índice substituto que conste do contrato. Na hipótese de não haver índice substituto e caso não haja acordo entre as partes acerca de um índice substituto, deve ser utilizada uma média de índice de preço de abrangência nacional na forma de regulamentação a ser baixada pelo Poder Executivo.
E dizemos também -aí eu já estou entrando numa área que eu ia pedir ao ministro Paulo Paiva que tratasse, a partir do artigo 9- que é assegurado, sim, aos trabalhadores, na primeira data-base após a vigência desta medida provisória, o pagamento do reajuste relativo à variação acumulada do IPC-r entre a última data-base e junho de 1995, inclusive.
Mas eu prefiro parar por aqui. O objetivo é dar espaço para algumas perguntas e pedir que, a partir deste momento, o ministro Paulo Paiva fale sobre a parte referente a salários e os artigos dessa medida provisória que dizem respeito à Justiça do Trabalho. Então, com a permissão de vocês, eu pediria que o ministro Paulo Paiva assumisse a conversa, a partir de agora.

Paulo Paiva - Bom dia. Eu pretendo ser bastante breve em relação aos aspectos que estão descritos na medida provisória. Vocês podem perceber que, entre os artigos 9 e 14, há dispositivos que, de alguma forma, regulamentam as condições de negociação coletiva no Brasil.
Basicamente, a estrutura trata das negociações coletivas. Depois, do processo de mediação, que é uma inovação nesse aspecto, e sobre os dissídios coletivos. Esses aspectos foram amplamente discutidos com os diferentes segmentos da sociedade, com vários economistas, com membros da Justiça do Trabalho, com membros do Parlamento e do movimento sindical, e a idéia objetiva é caminharmos para ampliar o espaço de livre negociação no mercado de trabalho sobre salários e sobre outros aspectos.
Do ponto de vista dessas medidas, não há nenhuma inovação e nenhuma ruptura em relação ao processo vigente. Eu poderia dizer a vocês que há uma conexão desta medida provisória com a lei 8.880.
Na lei 8.880 foi estabelecido que, a partir do primeiro mês da emissão do real, que foi de julho de 94, na primeira data-base da categoria era assegurado o IPC-r como base para a negociação coletiva. Isso se mantém até o mês de julho e, a partir daí, nós continuamos com o mesmo processo, garantindo na próxima data-base a incorporação do IPC-r entre a última data-base e o último mês de cálculo do IPC-r. Como exemplo, no mês de agosto de 94, as categorias que tinham data-base nesse mês tinham garantido um mês de IPC-r. No mês de setembro, tinham dois e sucessivamente até junho de 95, que têm 12 meses. A partir do mês de agosto temos outros 11 meses, de setembro, dez meses e sucessivamente. Com um processo de incorporação do IPC-r e um processo de retirada da garantia do reajuste

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