São Paulo, sábado, 1 de julho de 1995
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Sempre os mesmos

O Plano Real começou com uma âncora cambial. Mas o governo prometia, aliás desde antes da nova moeda, chegar o mais rápido possível à âncora fiscal.
Nem saímos da âncora cambial, nem chegamos à fiscal. A sociedade espera até hoje pelos ajustes decisivos e pelas reformas audaciosas na esfera do setor público. Mas o aniversário do real vai ser mesmo celebrado é com a instituição de uma âncora salarial.
O sistema financeiro recebeu apenas retoques de maquiagem. Apesar das inúmeras promessas de acabar com a ``zeragem automática", de reformar a indústria de fundos de investimento de curtíssimo prazo ou até mesmo de criar mecanismos de financiamento de longo prazo, na prática quase nada muda. E os outros contratos da economia, como aluguéis ou escolares, continuarão com cláusulas de correção monetária automática anual.
Aos assalariados está vedada por lei toda e qualquer cláusula de correção automática pela inflação passada, excetuado o resíduo do IPC-r até junho. A diferença fundamental é que todos os demais contratos com prazo de um ano ou mais podem prever correção automática anual, desde que vencidos os primeiros 12 meses sem correção.
No campo das teorias a desindexação salarial ocupa lugar central no esforço de combate à inflação. Ou seja, é impossível eliminar a inflação sem desindexar salários.
Mas se a desindexação salarial é necessária para estabilizar os preços, não é suficiente. Isto é, a nova lei, se não resulta obrigatoriamente em arrocho salarial, no mínimo coloca os salários diante de riscos aos quais o governo não ousa submeter outros setores da economia. Pior: as aplicações financeiras seguem continuamente corrigidas e os impostos permanecem com correção trimestral. Mais uma vez, o governo não só não faz a sua parte, como ainda protege o capital, realimentando a ciranda financeira.
De outro lado, muito pragmaticamente, o próprio governo tem consciência de que o desaquecimento econômico, necessário hoje para diminuir as importações e reequilibrar a balança comercial, não virá apenas por obra e graça de juros altos e arrocho creditício.
Sem poder prolongar a âncora cambial, frente a limites cada vez mais gritantes ao uso e abuso da âncora monetária, incapaz de lançar em tempo hábil uma âncora fiscal confiável, o governo coloca as fichas da estabilização econômica no fim da correção automática de salários e na manutenção do prazo mínimo de um ano para a correção de outros contratos.

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