São Paulo, segunda-feira, 3 de julho de 1995
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`Apollo 13' exalta o herói americano fracassado

LUÍS ANTÔNIO GIRON
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

O ator Tom Hanks, 38, afirmou pela TV na última sexta-feira que o seu maior sonho é fazer o papel do presidente John Fitzgerald Kennedy no cinema.
Nada mais apropriado para o astro norte-americano, que de filme a filme constrói uma imagem da única modalidade possível de herói nacional para os EUA hoje: a do homem comum, com QI médio e pendor à previsibilidade.
Mais uma vez, Hanks protagoniza uma epopéia da medianidade (para não dizer mediocridade): o divertido filme ``Apollo 13", do diretor Ron Howard, baseado em episódio real sobre uma missão fracassada à Lua em 1970.
Hanks participou na sexta do programa de entrevistas de Larry King para promover a estréia do filme ``Apollo 13". Está agendado para estrear no Brasil em agosto. Já é sucesso instantâneo nos EUA.
Longas filas se formaram em todo o país, no início do feriado de 4 de julho. Perto dessa data patriótica, em 20 de julho de 1969, Neil Armstrong fincou a bandeira americana na Lua.
Hanks se valeu de informações da Imagine Entertainment, produtora do filme, para estimar um público de 20 milhões para a primeira semana de exibição.

Ficção sem ficção
O aspecto curioso de ``Apollo 13" é ter adaptado para o cinema o livro de memórias do astronauta Jim Lovell, ``Lost Moon" (Lua Perdida). Trata-se da primeira superprodução sobre espaço baseada em episódio real; quase uma ficção científica sem ficção.
Em abril de 1970, a aeronave Apollo 13, pilotada por três astronautas da Nasa, sofreu uma explosão durante expedição à Lua. A nave errou por sete dias pelo espaço, com o oxigênio vazando e o sistema elétrico em colapso.
Os astronautas conseguiram pilotá-la manualmente e voltar à atmosfera. Foram resgatados no mar japonês. A comoção pública teve proporções mundiais e transmissão via satélite. Mas a massa logo se esqueceu. Voltou à guerra do Vietnã. A história também se encarregou de obnubilar o fato. Só a Apollo 11 permaneceu.
Um filme sobre uma expedição exitosa não faria o mesmo furor. Neil Armstrong é uma entidade transcendental que pouco tem a ver com o espectador médio. Este se identifica com Lovell, o herói fracassado, o que não chegou lá.
Hanks passa o filme a fazer caretas e micagens e a bater cabeça na escotilha. Provoca simpatia. E ``Apollo 13" tem velocidade para excitar o público.

Ação em interiores
Howard rez um filme de ação só com interiores. Filmou em uma cápsula dentro de um avião, com gravidade real zero. A câmera se movimenta inquieta pelos 8 metros quadrados onde atuam os três astronautas.
A cenografia verticalizada dentro da nave contrasta com as duas outras principais sequências em interiores do filme, a da sede da Nasa e a da casa de Lovell. Ali, a câmera é teatral, linear.
Na Nasa dá-se uma saga de gabinete. A equipe que monitora a nave toma por vezes decisões que nem sempre correspondem às necessidades dos cosmonautas.
Um episódio cômico mostra o funcionário da Nasa que resolve o problema crucial de oxigênio da nave criando uma engenhoca feita de mangueiras, fita adesiva e caixa de plástico. Foi uma das últimas vezes em que a alta tecnologia se rendeu à gambiarra.
O melhor do filme está em provocar a sensação de ``huis-clos" no espaço interminável. Epopéia entre quatro paredes, aventura claustrofóbica, ``Apolo 13" sacia a nostalgia pública do tempo em que o programa espacial tinha camarote no imaginário da América.

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